Escrever solto e agora, em verves da vontade e do sonho, para celebrar a vida em vida de Caetano Veloso, me dá uma alegria há meses não sentida. As canções que me ergueram, me apanharam para o entendimento de mim, me levaram aos livros, ao cinema, teatros, outros discos, ao sentido de querer viver com liberdade.
Caetano salvaguarda o alumbramento das canções, perfila no seu canto as possibilidades enormes da beleza do homem cantando: o ritmo e a clareza – molhados vezes na doçura, vezes na violência criativa do artista. Um trabalho da multiplicidade perceptiva de uma mente genial a tratar do mais necessário como o direito ao amor das sexualidades dissidentes, até os exercícios preconceituosos e vazios de defender a imobilidade da língua em nome das normas cultas que sustentam os idiomas: coisas de poeta endinheirado.
Não se pode pensar a cultura deste país sem sua presença marcada em grandes feitos. O homem que tem para o Brasil, o mesmo valor que Jean-Paul Sartre tem para a França. E Caetano, entre nós e no mundo, não precisou escrever livros para nos mostrar o seu lugar de pensador e a força do seu querer para interferir na realidade social brasileira. Fraturou a nossa cultura várias vezes para colocar nossa audição contra padrões comportamentais perversos e enfrentou com o corpo e a poesia a estruturalidade do racismo e da lgbtfobia.
Erra como todos e todas, pequenos e grandes, famosos e anônimos. Quando acerta, e faz mais, nos leva para dentro deste orgulho infinito de tê-lo vivo, atuante, inventivo, contemporâneo deste país que precisa dele vivo e com saúde, se fora das denúncias e combates, dentro das possibilidades de embalar sonhos amores utopias, ou tão somente cantar o repertório que desagua rios de beleza no melhor do cancioneiro existente em todos os tempos de música popular no Brasil.
Ê Caetano,
Eu sinto frio nordestino no Brasil,
Sinto medo ao sair de casa,
Medo de morrer sem envelhecer,
A cara comum da minha existência
Sem despertar saudades na massa.
Ê Caetano
Saudade de lhe ouvir referendar o Balancê de Gal
De reinventar The Beatles
E posar nu na janela na piscina margarina
Enganando entre a dor e o prazer.
Você,
Remate deste meu viver ao vento
Poeta máximo da minha erudição
Meu país mais que divino
Feminino, masculino e Plural.
Porto alegre do meu coração de menino.
Parabéns, paixão da minha vida!