segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Depois de assistir Tropicália



Caetano Veloso: Tropicália
Parece, em mim, o retrato da realização em fragmentos da impossibilidade. Um homem diluído em muitas linguagens acenando para a transformação. O jeito descontente no sorriso que ilumina. O que diferente não poderia ter sido, e incita a não ficar no lugar. Escritos boiando nos esconderijos da vida, tesouro distante no solo desconhecido do Recôncavo – formato baiano num diálogo com o mundo. Poeta de qualquer língua em qualquer cidade. Poemas que nos desfiguram e alteram nossas verdades. Coragem do ser, agonia do tempo, destempero pedagógico, libido, amanhecer.
Atropelo nos padrões quando a chegada do homem quase menino mulher negro santo demônio orixá ateu. Idílio da solidão e o filme narrando a sua grandeza. Valor da existência entre o nada e a música: morada da memória que o eterniza. Receitas comportamentais na dança certeira da sorte. Programa dos deuses. O menino nascido mito e lançado à verve das contradições. Sísifo. Domínio do Oráculo de Ifá. Teoremas e traços calculados. Cigana sem consorte. Desamparo no medo. Odé contra a morte. Mulato cartesiano.
Nitidez abrasiva num projeto coletivo. O que mais sabia e ardia; era dureza, agridoçura, sexualidade ambígua e acesa, vontade de causar e ficar no sempre do país que ajudou a reinventar. A palavra como arma a favor também da conservação. Transbordo da beleza mais vital que deu sentido existencial a quem carecia pensar diferente.
Ele é o ingresso nas maneiras do fazer profundo: mercado e academia, literato e repentista, ator e galã, cantor de cameratas e agitador de multidões. Homem de batom rosa na boca. Os olhos tristes de Londres. Desenho seu que faço na face secante das águas do Abaeté ouvindo It’s a Long Way, esperando mais palavras e sons que recontem a sua história e impilam o exercício deste meu amor.

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