sábado, 29 de novembro de 2008

Os azuis de Jenner Augusto

Alagado Azul

Uma devida homenagem se cumpriu. Por quase quatro meses, a Sala de Arte Contemporânea (SAC), do Palacete das Artes Rodin Bahia, abrigou as mais representativas obras de Jenner Augusto, ilustríssimo pintor brasileiro, nascido em Sergipe, mas radicado em Salvador, homenageado por uma iniciativa de Murilo Ribeiro, outro expoente das artes plásticas no Brasil, que é o atual diretor do Palacete. Com a colaboração do governo do Estado, da Secretaria de Cultura e do Ipac, mais a curadoria impecável de Zeca Fernandes, neto do artista em questão, promoveu-se a vitoriosa mostra Da natureza em busca da cor.

O nobilíssimo espaço da SAC foi acrescido de beleza por 92 quadros que dão a exata dimensão do trabalho de Jenner e perfilam a sua força criadora em relação à combinação de cores e formas que garantem a elegante expressividade deste artista. O jovem museu é inclinado a espelhar as obras consolidadas em nosso tempo, em várias linguagens, a fim de promover processos educativos entre o público estudantil deste Estado, de dinamizar a noção e os valores em torno das artes plásticas, de cultivar o espírito investigativo e despertar, entre nós, a vontade de se divertir e aprender dentro das esferas museológicas.

Jenner Augusto, em sua cadência azulada, foi outro trunfo favorável à atração de públicos para o Palacete. Uma obra consagrada e validada nacional e internacionalmente, que arregimentou fãs da estatura de Jorge Amado, Érico Verissimo, Carlos Drummond de Andrade, Vinicius de Moraes, dentre tantos outros; uma obra fazedora de denúncias contra as injustiças sociais, que nunca perdeu a leveza e fez poesia com as tristezas geradas por realidades erguidas da pobreza que cerca os nordestinos e todos os brasileiros.

Em uma trajetória de sucesso, Jenner Augusto coloriu o Brasil, sendo comparado a Candido Portinari, na época em que Jenner criou a chamada fase Retirantes do Nordeste e pintou a dura saga dos retirantes e sobreviventes desta região brasileira, indo ao encontro, do ponto de vista artístico, da literatura de Graciliano Ramos, fazendo com suas tintas uma intertextualidade com a escritura do mestre das letras de Alagoas, autor de Vidas Secas.

A obra de Jenner é uma extração poética das possibilidades de beleza que o azul traz. Mesmo aplicando-se a uma fenomenal combinação das cores que a natureza dá, o pintor é um fiel retratista do azul em suas variantes e emite mensagens que nos inclinam a olhar para o alto, a alcançar o céu, a ganhar o mar, especialmente o mar da Bahia, manancial do azul fremente no genial trabalho deste sergipano universal.

O Palacete das Artes prepara-se agora para abrigar a exposição Abraços na Arte: Brasil/Japão, em comemoração aos 100 anos da imigração japonesa, que será de 11 de dezembro até 1º de março, e espera-se um público maior e mais diversificado, para fazer jus às lições artísticas deixadas por nosso Jenner Augusto.

(Publicado no Opinião do A Tarde em 29/11/2008)


segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Clarice Lispector

Eis a minha escola melhor, maior, mais íntima. A forma mais intensa do meu aprendizado - palavras desbragadas minhas naquele jeito sublime de dizer tudo que nos basta. Eis esse mistério reluzente à frente de todo futuro que terei e que sempre me fez respirar, calar e viver o impacto da sua escrita. Eis o meu olhar naqueles olhos de dor e criatividade; a cara da mulher calada, cênica, mítica, mãe e senhora do eterno adeus...
Eis esse desapego dos entendimentos, a máxima dos sentimentos, música dilacerante da existência que fez da vida ARTE.
Palavra que dói, que sangra, mas que salva. Salva da solidão e do tédio. Nos impele a enfrentar nossos inconfessáveis segredos e amplia nossa imaginação melhorando as personagens que escolhemos ser cotidianamente.
Palavra que arde e abre profundas possibilidades... Às vezes irreversíveis.
P.S.: Hoje é uma noite escura, ouço Cida Moreira cantando Chico Buarque, trabalho em um release sobre Rilke, estou em um museu lindo, a cidade ainda é Salvador, o tempo é quente, coisas do verão, minha memória é de Caio Fernando Abreu e Clarice: contos da minha assombração amorosa. Acho que estou vivo... Sinto falta de ar. Estou vivo nesse tédio sem Clarice e olho dentro dos seus olhos na esperança do azul/castanho que me alimenta; pego Felicidade Clandestina e vago no meu desejo de ser escritor e talvez, amado. Hoje é quente e escuro e Salvador e tédio sem brisa sem mar e eu em outra existência. Meu peso é o peso de Clarice. Perdão a todos.

sábado, 22 de novembro de 2008

Eternamente

"Pois tudo que é amor
Parece com você,
Pense, lembre, nunca vou te esquecer"

Meu amor na voz desta mulher:
Só mesmo o tempo
Pode revelar o lado oculto das paixões
O que se foi
E o que não passará
Inesquecíveis sensações
Que sempre vão ficar
Pra nos fazer lembrar
Dos sonhos, beijos
Tantos momentos bons
Só mesmo o tempo
Vai poder provar
A eternidade das canções
A nossa música está no ar
Emocionando os corações
Pois tudo que é amor
Parece com você
Pense, lembre
Nunca vou te esquecer
Vou ter sempre você comigo
Nosso amor eu canto e cantarei
Você é tudo que eu amei na vida
Nunca vou te esquecer .
Tunai / Sérgio Natureza

P.S: Acima, a voz doce dos ventos, Gal Costa, eternizando a memória do amor de mim.

Los angeles, Cidade Proibida


A primeira vez em que assisti a este filme, foi no cinema do Shopping Caboatã, no Imbuí, bairro classe média da Cidade da Bahia; assisti cheio de dúvidas com o pensamento preso a uma história torrente de amor. Da primeira cena, com aquela narrativa jornalística, a trilha jazzística, as imagens leves, fortes, belas, sujas, conduziam-me a uma das películas mais marcantes da minha vida de espectador da "7ª arte": meu pensamento me libertou para aquela novela e para a recepção de sua história tão inteligentemente contada e de nuanças da genilidade de algumas atuações, do indefectível roteiro, da direção impecável, da trilha linda linda linda...O filme. Mesclado de subtextos que desvelavam uma história de amor impossível e indizível e improvável entre dois machos policiais de Los Angeles. Já o vi diversas vezes. Um dia li uma crônica de João Silvério Trevisan sobre esta película e retornei ao filme mais satisfeito ainda. Trevisan sempre pontual, elegante, desconcertante, elucidativo e pedagógico, ampliou muito o meu olhar apaixonado por esse marco do cinema americano espraiado pelo mundo para o bem da nossa imaginação, diversão, transe e lucidez. Imperdível em infinitas exibições. Repita-se.

Márcia Short

Uma linda homenagem a lindeza artística de Márcia Short: bem para nossos ouvidos...


Quando Oyá resolveu entrar num acordo com Xangô, Iemanjá e Oxum, foi para acertar direitinho como seria o aparecimento de alguns seres na Terra, tendo um em especial...Oxalá falou para ter calma com a força, por que os humanos normais não estão lá muito preparados para certas existências entre eles.Oxum, muito faceira e sabedora das artimanhas para adocicar o pai do branco e maior de todos os Orixás, disse ao Grande Senhor que não se preocupasse, pois, aquele ser que viria ao mundo condensaria sua beleza e vigor nos traços da fisionomia e na voz. Os traços seriam admirados por todos e a voz, embora percebida e agradável aos ouvidos mais comuns, apenas tocaria de verdade e com toda sua capacidade de encanto aqueles que se deixassem permear pelo pedaço de astral que aquela voz iria conter.Deste modo, permitindo tal acontecimento na Terra, foi no Brasil, na Bahia, e nos tempos em que vivemos, que a voz desta moça ecoa para todos os que podem ouvir...
Ademais,
Axé, Márcia Short!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Carlos Barros

P.S.: Eu também a sinto assim. Valeu, Carlos.


sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Fly me to the moon

Paula Toller
Uma marca sutil da saudade de um tempo inconcluso: uma doce tristeza que ventila minha memória neste 21 de novembro de 2008, em Salvador, friozinho e chuva e saudadezinha...
Fly me to the moon and let me play among the stars
Let me see what spring is like on Jupiter and Mars
In other words
Hold my hand
In other words
Darling, kiss me
Fill my heart with song and let me sing forever more
You are all I long for, all I worship and adore
In other words
Please be true
In other words,
I love you
Bart Howard

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Consciência Negra 2008

" Olá, Negro! O dia está nascendo!
O dia está nascendo ou será a tua gargalhada que vem vindo?
Olá, Negro!
Olá, Negro!"
Jorge de Lima



Por algum lugar que haja esperença em ser e estar.
Pelos olhos na beleza da criança trazendo, de fato, novas manhãs.
Pela doçura que engendra as ingenuidades e permite o abraço.
Para o que eu trago no ori e é mãe florescente marítima
Energia surgida em Abeokutá, me dá eixo, me faz sonhar.
Para o exercício íntegro da diversidade e para
A livre manifestação da criatividade.
O corpo e a alma sendo.
A mão e o desejo tocando.
A...
O...
A vida que vale a pena pois traz sentido.
O painel de todas cores...
Para a força do meu sorriso
Pairando no pleno sorriso da criança que me estampa...
Por um novo destino
Na criatura que vejo na escritura deste texto.
E que o sangue seja arte.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O melhor lugar é ser feliz

São Paulo
Para Michelle Cirne
Em algum lugar o coração repousa e se lança ao sentido real da existência: muitas horinhas de felicidade. O lugar é o que menos importa - o que vigora e conduz é o mote das sensações inscrito no desejo de estar. O que importa é o cotidiano que nos abriga e nos permite pensar, criar, expressar, mover, mudar, realizar e mais que tudo: AMAR.
São Paulo pontua tudo isso. É o centro das movimentações. Palco para todas as artes e recanto múltiplo para as diversas formas de pensamento. São Paulo é a beleza em seu constante estranhamento e pulula de criação que machuca e deslumbra, que sufoca e liberta, que adoece e cura; é música, confusão e silêncio... Manancial das possibilidades que atraem e expurgam. Às vezes, para quem se lança em sua argonave de busca, São Paulo é solução. Pouso do coração que se agita de amor e criatividade. Coragem assim: uma mulher que se desapega e se encontra.
O mundo é um caminho.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Os olhos na vitória!

Em mim, essa mulher é um amuleto de sorte! E hoje é um dia de sorte...
E eu vejo o mundo com olhos de vitória - vejo o mundo com olhos de águia
Vejo o mundo com os olhos de Bethânia.
Meu olho d'água chora alegria e comunga com a minha melancolia...
Estou na linha do horizonte enxergando muitas possibilidades...
Vôo para além dos lugares num momento de intensa respiração.
Pequenos momentos da conquista de fora realçando as conquistas de dentro.
Meu tempo é agora e eu me encontro comigo tristinho e cheio de felicidade...
Felicidade por poder continuar e fazer algumas coisas do meu real querer.
O olho da cobra verde não me mete medo. Meu segredo é a força d'água.
É da água que me vem meu sustento e minha ventilação.
Meu olho que fita a sorte e a canção que, em mim, se derrama Bethânia.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Lady in Satin


Ouvi-lo é alcançar toda melancolia que há no mundo. Ou talvez, em maior proporção, toda melancolia que há em mim. O curioso é que além de me deixar muito triste, ouvir este CD me deixa cheio de tesão, a libido me domina e eu singro, mentalmente, os corpos que mais desejei na vida. A maior cantora do mundo está ali se despedindo e eu choro todo. O sentimento do mundo é meu e lembro a presença doce de alguém que não passa quando Billie Holiday canta e, neste disco, eu sinto ainda mais fortemente. É porque sou tolo. E só sei amar como tolo. Bebendo o que tiver mas ouvindo só Lady in Satin, maestria da Lady Day.

Por dentro do desespero


Esta é a imagem do cuidado. Panorama da idealização de algo que ficou pra lá. Mas nela, a imagem, está no agora do que vejo. Como este filme me liberta de tudo que não quiseram pra mim, e através dele, sou o meu próprio desejo, minha auto-delação, minha proscrição, meu fascínio. Sou o descuido do meu medo diante de um sorriso que me impregna de alegria, que passa velozmente por mim, agride em doçura a minha memória e fica.
Fica no sensível da minha franqueza e no silêncio da minha alma. Fica eu sendo inteiramente outro. E eu revivo uma espécie de desespero - o amor alongando-se de nada tornando-se eterna morada de todo romantismo. Meu amor palavra na imagem deste filme. Película que alavanca saudades. E dentro do meu desespero com cheiro de café, música e identidades antropológicas. Um filme do amor salvação me condenando ao riso, que quando vejo, sou-me o tormento da vontade banhada de tempo pretérito - eu volto e o reassisto.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Pedacinho de amor e alegria !


13 de novembro de 2008.
Os anos passam numa leveza e numa intensidade do jeito da amizade.
Hoje - amanheceu Billie cantando - o dia foi de saúde, de perfume, cintilar vermelho e branco.
O dia das flores da alma, do riso, do aconchego, do carinho discreto e inteiro, verdadeiro, azul.
Uma manhã primaveril para um encontro que renasce sempre.
Dia de coragem: coisas da intensa maneira de gostar...
Dia da alteridade: a diferença que aproxima...
Dia de águas e sonho: o amor que perdura para além dos tempos cronológicos.
Hoje, 13 de novembro de 2008 - lotado feriado que marca uma grande presença.
A menina da pele, da boca de sorvete, do silêncio educativo, da força, do conteúdo e da forma.
A beleza de sempre, minha linda, Maíra Caffé.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Charme do Mundo



Ela sempre me foi uma boa surpresa: uma cantora linda, uma compositora marcante e uma mulher exemplar. Luz em nossos ouvidos. Inventou, com sua arte, guiar meus sonhos de amor. Tudo nela me veio sempre em nome da beleza, da safadeza, da transgressão. Minha Marina cantando para a vida que eu sempre quis e não tive, mas tenho quando ela canta. Em Charme do Mundo eu me sinto ouvindo Billie Holiday, e me persigo na idéia do afeto que preciso exercer. Marina não sai de mim. Marina febre, lindeza e outras coisas mais:

Eu tenho febre
Eu sei!
Fogo leve que eu peguei
Do mar, ou de amar, não sei
Deve ser da idade...
Acho que o mundo faz charme
E que ele sabe como encantar
Por isso sou levada, e vou
Nessa magia de verdade(Verdade!)...
O fato é que sou
Sua amiga
Ele me intriga demais
Intriga!...
É um mundo tão novo
Que mundo mais louco
Até mais que eu
É febre, amor
E eu quero mais
Huuuuuum!
Tudo o que quero
Sério!
Sério!
É todo esse mistério
Esse mistério!...
Acho que o mundo faz charme
Mas ele sabe como encantar
Por isso sou levada, e vou
Nessa magia de verdade
Verdade!...
O fato é que sou
Sua amiga
Ele me intriga demais...
É um mundo tão novo
Que mundo mais louco
Até mais que eu
É febre, amor
E eu quero mais
Huuuuuum!
Tudo o que quero(Tudo que eu quero!)
Sério!
É todo esse mistério...
Todo esse mistério
Todo esse mistério
Mistério!...

Marina Lima/ Antonio Cícero

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Plata Quemada


"Aqui é o lugar da água, tudo é memória, tudo se molha, tudo se afoga, mas, às vezes , se salva. "
Marlon Marcos
Para que ainda haja tempo de assistir.
E eu ouça, ali, Billie cantando o meu amor sendo sem acontecer.
Uma história de profunda comoção. Um filme para gigantes. No meu caso, dois bem pequeninos.
Avante. A vida é possível!

A voz da intuição


Antes existia somente esperança. E era um movimento único de acreditar por acreditar. Aquela presença da fé; mas tudo muito árido. Tudo transcorria num misto de querer e achar que ia acontecer e se via e se escrevia e se rezava obtusamente, disciplinarmente para algo que não podia e nem no coração funcionava. Ou seja, o coração não garantia e nem referendava aquela quimera revestida de paixão...O tempo passava sem gerar transformação e o amor adoecia. Mas ainda pulsava a tal esperança.
Esperança e expectativa. Nada do envolvimento da sensação. Do saber de difícil decodificação o qual chamamos intuição. Faltava isso : intuição para desvendar a armadilha. Uma história esperançosa e cheia de fantasia - coisas que se muito quer aqui - e ia desaguar na nulidade da vida. Nada se erguia. Nada se projetava. Nada acontecia.
Esperança para alimentar um amor atemporal; amor de perdição. Fagulhas da canção Maurício na voz saudosa de Renato Russo - "voltar a ser feliz"... Amor em esperança mas sem tradução.
Faltava. E o fio da ligação era inquebrável, indestrutível quanto a idéia que se tem de DEUS. O mundo se perguntava sobre as almas que andavam em distração mas não aconteciam. Amor de silêncio numa falta de intuição. Nada da voz benéfica de dentro que nos salva, que nos agride, que nos intimida, que nos amedronta mas , mais que tudo: nos liberta.
Voz de vôo... Imagem de liberdade ...Uma águia voando...Transformação...Força do que tem que acontecer...Amanhecer juntinho...Anoitecer corpóreo... Récitas do silêncio...Olho no olho. O querer querendo...E , tendo. Você.
Esperança na minha falta de intuição.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

É o que me interessa

Lenine ( instantes da realização)
Hoje é duro pensar e dizer assim:
Daqui desse momento
Do meu olhar pra fora
O mundo é só miragem
A sombra do futuro
A sobra do passado
Assombram a paisagem
Quem vai virar o jogo e transformar a perda
Em nossa recompensa
Quando eu olhar pro lado
Eu quero estar cercado só de quem me interessa
Às vezes é um instante
A tarde faz silêncio
O vento sopra a meu favor
Às vezes eu pressinto e é como uma saudade
De um tempo que ainda não passou
Me traz o teu sossego
Atrasa o meu relógio
Acalma a minha pressa
Me dá sua palavra
Sussurre em meu ouvido
Só o que me interessa
A lógica do vento
O caos do pensamento
A paz na solidão
A órbita do tempo
A pausa do retrato
A voz da intuição
A curva do universo
A fórmula do acaso
O alcance da promessa
O salto do desejo
O agora e o infinito
Só o que me interessa.
Lenine/Duda Falcão
P.S.: Eu ainda lhe digo SIM, viu?

Da minha aldeia

Talvez Salvador seja o meu maior sentido de cidade. Mas não só a vejo e sei até onde ela me interessa: uma coisa, agora, de finalização. Esta cidade tem o meu jeito de final e eu a recebo com os olhos em galope pelo horizonte afora. Eu a percebo paisagem e me misturo à minha própria agonia... Não sou do tamanho dela nem do tamanho da minha altura - e ela é a aldeia que me deu a garantia de melhor olhar o mundo. Uma cidade sem sorriso pra mim. Um lugar do meu pertencimento tão hostil em mim. Um vilarejo que me faz escapar da esperança - minha conduta de vida - e que me põe a sonhar com outros cantos aonde o sentido de estrangeiro tivesse sentido. Eu canto para Salvador com a voz e o inteiro de Jussara. Só neles, voz e inteiro de uma cantora mineira que mora no Rio de Janeiro, espelho da beleza crescente e das coisas que fazem sonhar, eu tão a exatidão do que isso aqui me foi como alumbramento e hoje é vontade de deixar.
Mas aqui me é assim:
Da minha aldeia vejo quando da terra se pode ver no Universo....
Por isso a minha aldeia é grande como outra qualquer
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho da minha altura...
Nas cidades a vida é mais pequena
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro.
Na cidade as grandes casas fecham a vista a chave,
Escondem o horizonte, empurram nosso olhar para longe de todo o céu,
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos nos podem dar,
E tornam-nos pobres porque a única riqueza é ver.
Alberto Caeiro
P.S.: Salvador me é o seu Mar.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Bem - vindo, presidente!

Barack Obama
Para desalinhar os vestígios da presença de G.W.Bush no comando dos Estados Unidos e trazer uma grande novidade à história humana no Ocidente: um homem negro, descendente de queniano, torna-se presidente no país do racismo desvelado, à mostra. Não estou falando de economias, de revoluções marxianas ou marxistas, ou bolcheviques, ou napoleônicas, castristas. Falo de Barack Obama, em carne e osso, negro, energético, uma vida que deu certo, que fala em destribuição de renda no âmago do capitalismo, é isso, dentro do capitalismo, sem nenhuma novidade neste sentido. O destaque vai para o que representa para a negrada espalhada no mundo, a ilustração da vida de Obama focado por todas as câmeras da Terra. Expressando sua tolerância a gays, outras minorias étnicas, dado a corrigir, no que for possível, as imbecilidades do seu antecessor, melhor não falar o nome para não dar azar, e cuidar internamente das marcas da pobreza atual do seu povo estadunidense. Bem-vindo, presidente!
Espelhe a sua negritude, retrate a sua jornada de superação, e aqui, no tempo presente, neste instante, respeite as diferenças, e ajude a garantir o direito de qualquer pessoa de amar, de gozar, com a mesma necessidade que temos de comer, beber, respirar... Corrija assim, os erros terríveis da belíssima Revolução Cubana, sob o comando de Fidel, que não entendeu a complexidade humana. Da sua diferença de negro no centro do poder, por favor, faça a diferença, em nome das liberdades afeto-sexuais, porque as demais todos querem ver garantidas. Axé no seu Ori intra-africano. E vaias para a Revista Veja do Brasil.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Bebel Gilberto


Ela já se mostrou em três discos. Uma artista de natureza muito diversificada que nunca nega a herança musical que recebeu em casa - João Gilberto, Miúcha e Chico Buarque - mas que também não se prende a isso e nem deixa de inovar, de se banhar em outras ondas musicais. Uma sofisticação só! Uma voz de brisa em dia de sol, de chuva em dia de frio - delícias que a canção traz... Bebel Gilberto é obrigação na cedêteca de quem ama música popular.

sábado, 1 de novembro de 2008

Impressões da grandeza

Virgínia Rodrigues

Sempre muito atento à cultura brasileira, Caetano Veloso, em 1997, assistindo Bye Bye Pelô, espetáculo do Bando de Teatro Olodum, dirigido por Márcio Meireles, descobriu o canto de nobreza de Virgínia Rodrigues. E daí, o Brasil e o mundo conheceram a expressão artística de uma ex-manicure dotada de reluzente talento que se tornaria uma das nossas melhores cantoras na contemporaneidade.

Ouvir Virgínia cantar é compreender que muitas coisas nascem para dar certo. E vencem os descaminhos que injustiças sociais promovem em nossas vidas. Sem muita escolaridade, ocupando o centro das discriminações que mais vigoram entre nós, ela, negra, mulher, pobre, gorda, é uma cantora sublime, exemplar raro da herança musical legada pelos negros africanos e veículo de belezas intraduzíveis que só a arte saída do grande talento pode expressar.

A sua voz camerística, imprimindo uma tonalidade erudita, ensina com maestria, como se pode cantar o popular de outras formas e sem subestimá-lo. Virgínia é um marco na nossa canção, e vem trilhando uma carreira pautada em trabalhos consistentes, conceituais, maduros; vem confirmando-se como uma das grandes divas da música no Brasil, sem muita visibilidade, sem os estrondos midiáticos dedicados às quase-dançarinas como Claudia Leite, longe de representarem, de verdade, a força das cantoras que em gerações diferentes iluminaram o nosso país: Carmem Miranda, Aracy de Almeida, Dalva de Oliveira, Elizete Cardoso, Maysa, Nora Ney, Alaíde Costa, Elza Soares, Silvinha Telles, Ângela Maria, Nana Caymmi, Clara Nunes, Cássia Eller, Marisa Monte, Jussara Silveira, Adriana Calcanhotto, Ná Ozetti, Rosa Passos, Marina Lima, Rita Lee, Daniela Mercury; citando também as que sintetizam em grandeza todas essas: Maria Bethânia, Gal Costa e Elis Regina, as maiores de todos os tempos.

Alcançar o canto de Virgínia é tomar contato com outras possibilidades musicais nossas, navegando um repertório que começa com releituras da Axé music, passa por Caetano Veloso, por Chico Buarque, apresenta novos talentos como Tiganá Santana, e pousa no centro da musicalidade audível em qualquer lugar no mundo. Assim como Jussara Silveira, Virgínia é outra baiana do mundo. E é matriz de uma singularidade real, sua presença é única e sua voz alimento promotor de elevação no meio popular da humanidade.

Seu novo disco, Recomeço, lançado recentemente pela Biscoito Fino, prima como sempre, pela beleza das interpretações e pela nobreza do repertório, com destaque para Todo Sentimento, de Chico Buarque e Cristóvão Bastos, que a acompanha ao piano, Beatriz, a difícil canção de Edu Lobo e Chico Buarque, Estrada Branca, de Tom Jobim, Alma, de Sueli Costa e Abel Silva, e a imortal de Dolores Duran, A noite de meu bem. Será lançado aqui em Salvador, na Sala Principal do Teatro Castro Alves, dia 13 de novembro, às 21h., em única apresentação. Imperdível.

(Publicado no Opinião do A Tarde em 01 de novembro de 2008)