sexta-feira, 30 de abril de 2010

Este tal Rimbaud


A ermo. Indo e vindo. Barco no vazio sentido de querer chegar. Escritos soltos presos numa paisagem de poemas-menino. O maldito libertador e fazedor de mortes. Avalanches de memórias e algum silêncio. Ditos da genialidade que acaba cedo. O desgosto. O corpo. A fatalidade. Tinta de sangue. Maldito. Colorido marítimo que se esvai no notívago espelho da solidão. Insensata criança incentivadora de transformação. Abandono de si sem desistência. Eternamente poeta, singularmente gente.
"E desde logo me banhei no poema
do Mar, infuso de astros, e lactescente,
devorando os azuis verdes; onde, flutuação pálida
e arrebatadora, um afogado pensativo às vezes vaga."

Caymmi: 96 anos!


Caymmi é dessas lembranças eternamente inspiradoras. Hoje, 30 de abril de 2010, ele faria 96 anos. A foto acima revela o mestre em seu Rio de Janeiro, sua cidade favorita! Vontade de ouvir lá canções desse inventor de uma tal Bahia apaixonante, que agora de tão longe do que ele idealizadou, acha de esquecê-lo... Marinheiro das águas das melhores canções feitas aqui; como diz Maria Bethânia, na música, o baiano maior, o número 1. Axé, mestre!

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Sobre antropólogos




O sentido de qualquer profissão, para além de subsistência, é gerar em nós a sensação contínua de ser ali, no exercício constante do ofício escolhido, acessível ao prazer inigualável de criar nos permitindo à utilidade.
Para mim, todo ofício começa de uma concepção de arte, engendra-se do ato de criações, perfilando esperança competência vontade alegria movimento cansaço mas continuidade. Maior que subsistência: a poesia nossa de cada dia.
O que retiro dali: minha existência a favor de mim e de outras existências; prazer humano de aprender ensinando e ensinar para melhor aprender; olhar para descobrir... Olhar-me em outros; outros fora daqui; outro coletivo ressignificando o que posso saber de mim.
Meu sentido profissional é ANTROPOLOGIA; sem síncopes de achar nela a perfeição; mas pela poesia que ela me entrega e a que escrevo a partir do que extraio dela. Muito romântico. Muito criativo.
*********
Para os provincianos proibitivos:
" A Antropologia é bem mais do que foi apresentado para você aqui e , caso você tenha interesse em saber mais, tenho certeza de que seu professor ou sua professora estarão prontos para auxiliar. E, é claro, você pode também ser um antropólogo profissional, e nem precisa mudar de curso. No Brasil, os antropólogos formam-se não apenas nos cursos de graduação em antropologia ou ciências sociais. Muitos se formam em faculdades as mais diversas, depois optam pela antropologia em suas especializações, mestrados e doutoramentos. Outros permanecem na carreira escolhida, mas utilizam a antropologia em seu trabalho" (p. 69).
- Excerto retirado do excelente Antropologia para quem não vai ser antropólogo, de Rafael José dos Santos, da Tomo Editorial, imprescindível para uma leitura introdutória sobre a poética antropológica. Aqui, para assar minha sardinha!

sábado, 24 de abril de 2010

Um nome terminado em mar

" Ao Mar Ao Mar - EU GRITO - EU QUERO O BARCO
Ninguém jamais se livra do passado?"
Elizabeth Hazin

Para fora dali, ao longe de muitas conclusões, ao largo dos dizeres da negação, mas à subida dos olhos e mãos querendo pegar ver outro coração humano; para fora dos sentidos promotores de regras, normatizadores das vidas sem sabor; para fora do pensamento amedrontado contrário ao desejo inteiro buscando alcançar a pedra e nela descansar.
Há o tempo das consolidações para o sentimento que sobrevoa os mares. Tempo para satisfazer os sonhos: encontro com o nome terminado em mar... Lugar das ilhas que sem matar a memória instaura o novo e tudo respira melhor para dentro do Recôncavo da alma dos praianos.
O barco, agora, navegando ali: uma leveza perfumada, o carinho protetor, o calor como tentação, o sorriso que chega antes da ânsia, o toque que liquefaz dureza em gozo. Instantes sobre a pedra.

Amor, talvez saudade

"A saudade é o revés de um parto

A saudade é arrumar o quarto

Do filho que já morreu".

Para atiçar e trazer à tona o que em nós está mais interno acenando acenando acenando...Tão de leve quanto silêncio na memória daqueles olhos banhando-se de esquecimento. Para matar a despedida e com a vida manifesta existir-se aonde o tempo não nos pode vencer: o AMOR.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Oxóssi/São Jorge por Jorge Amado


Oxóssi por Carybé
Sobre Oxóssi, São Jorge no candomblé da Bahia:
"Oxóssi, rei de Ketu, meu pai e pai de mestre Carybé, de Genaro de Carvalho e de Camafeu de Oxóssi, é São Jorge matando o dragão. Deus da caça, das húmidas florestas, com o ofá (arco e flecha) abate os javalis, as feras, é o invencível caçador. Rei Oxóssi, Senhor de Ketu, rodeado de animais, usa capanga e chapéu de couro. Carne de porco, eis sua comida preferida. Gosta também de bode e galo, mas não tolera feijão branco. Come ainda axoxô, milho cozido com pedaços de coco. Dança com o ofá e o erukerê — feito com rabo de boi ou de cavalo. Sua palavra de saudação é Okê. Existem várias qualidades de Oxóssi: Otin, Inké, Ibualama. Nos candomblés gêges há um Oxóssi chamado Aguê, sempre metido na mata virgem. Orixá poderoso, encantado do maior respeito, suas festas são de grande beleza e opulência. Uma delas, a das quartinhas de Oxóssi, no candomblé do Gantois, onde reina a veneranda Mãe Menininha, é inesquecível espetáculo. Filha de Oxóssi é Stella, mãe-de-santo do Axé do Opô Afonjá" (p. 160)
Palavras do meu mestre literário Jorge Amado da Bahia de todos os Orixás! E Santos também!!! No livro Bahia de Todos os Santos:guia de ruas e mistérios. Já pra leitura!

quinta-feira, 22 de abril de 2010

São Jorge: o lado turquesa da Proteção

Obra de Ygas Eloy
Salve Jorge, meu arqueiro do verde-azul daqui. Amanhã é 23 de abril, seu dia de celebração que no Rio de Janeiro se veste de vermelho. Pai popular da proteção dos brasileiros que na Bahia verdeja nosso azul e salta altivo por entre nossas matas. Rezas milhos caldos cânticos danças poemas e Fé! Senhor da caça e da guerra irmanando-se a Oxóssi e Ogum. Valha-me e me põe de pé frente aos meus inimigos... Esmaga a inveja alheia e abre em mim os canais serenos da sabedoria!É seu dia santo em cada casa do nosso povo. Espalha o seu exemplo vencendo o dragão da opressão e nos ensina a ser e a ter uma vida luminosa misturando trabalho, prazer, disciplina, bondade, força, criação, energia, alegria, tristeza, paixão, realização, amor e muitas horas de felicidade!
Salve Jorge e entra aqui, a casa é sua!

Despedida


"A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo."
Dos domingos em que me perco de mim e a onda do tédio, inerte sem dança, me lança à inutilidade da vida. Descrevo a força do olhar sofrido no dia anterior e bem ressaqueado desaqueço-me dos sentidos que motivam a esperança. Domingo eu sou aquele silêncio da cruel saudade... O que é tão perto mas inunda de distância e esperar é estar lá na longínqua cidade, num desenho feliz da infância... Domingo seu sobrenome é tédio. Um tipo de chuva que machuca a telha do pensamento e nem desabamento é possibilidade. Domingo é ser vazio no construto dos feriados e existir sem centro. Calar de dor generalizada e desmagnetizar o cinza, ampliar o roxo, obscurecer a recepção da alma e perder o azul promessa dos melhores sonhos.
Domingo é o contínuo da mais terrível despedida...

Maria Bethânia: o canto como narrativa e escritura

Foto de Claudio Leal ( Terra Magazine)
Marlon Marcos
Especial de Salvador (BA)
As marcas históricas da força da oralidade em culturas ágrafas no mundo podem ser identificadas pelo legado sócio-cultural e religioso de várias etnias africanas e indígenas em países construídos pelo sistema da colonização moderna e que temos como excelente exemplo de formação civilizatória o híbrido Brasil.
No Brasil, país marcado pela inventividade de matrizes culturais africanas, que aqui chegaram ágrafas, a sábia oralidade de povos como o iorubá, nos legou sistemas e práticas religiosos complexos e nos fez reproduzir e reinventar entre nós elementos das chamadas religiões tradicionais ou religião dos ancestrais, âmago perfilador das antigas sociedades iorubanas.
A palavra se constituiu fundamento nos chamados terreiros jeje-nagôs baianos, assim classificados pelo antropólogo Vivaldo da Costa Lima, nome dos mais importantes neste país quando o assunto é a etnologia das religiões de matriz africana; a palavra dita trazia o teor mítico para a composição de todos os rituais litúrgicos do candomblé e reforçava a importância da oralidade como instrumento de transmissão de valores e sentidos religiosos imprescindíveis para a existência do culto aos orixás.
Assim sendo, a sacerdotisa maior, chamada iyalorixá, ou o sacerdote supremo, chamado babalorixá, funcionava (e ainda funciona) como transmissor oral do conhecimento religioso reproduzindo com afinco e imaginação o papel social dos griôs no universo iorubano.
As narrativas musicais na voz de Maria Bethânia
No cenário da Música Popular Brasileira existem diversos compositores que retransmitiram, em sons e letras, os sentidos culturais dos negros iorubanos no Brasil: Dorival Caymmi, Vinicius de Moraes, Baden Powel, Edu Lobo, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Paulo César Pinheiro, entre outros. Tivemos vozes femininas pioneiras amalgamando universos religiosos como o candomblé de ketu e angola, umbanda, quimbanda na rota diaspórica africana em terras brasileiras: Elis Regina cantou Arrastão, O canto de Ossanha, Reza, entre outros sambas afros; Clara Nunes foi a maior porta-voz no formato religioso umbanda, no sentido carioca desta prática religiosa. Agora, no modelo tradicional jeje-nagô de alguns terreiros baianos, o canto mais representativo, em nossa canção, foi e é o de Maria Bethânia.
Antes mesmo de conhecer e se iniciar com Mãe Menininha do Gantois, Maria Bethânia já cantava orixás e caboclos de modo mais disperso e sem as modelares representações estéticas que o candomblé de ketu trouxe para sua arte.
A partir de 1973, tornando-se freqüentadora do Terreiro do Gantois, Maria Bethânia passou a ter posse de um saber litúrgico que ela, com cuidado e respeito, foi integrando ao seu ofício de intérprete e espalhando pelo Brasil a beleza da religiosidade de origem iorubana reinterpretada na Bahia.
A sua voz, de modo freqüente, passou a transmitir trechos de narrativas míticas recriadas por compositores como Caetano Veloso e Gilberto Gil, quando não, de modo integral, a ecoar cânticos sagrados aos orixás do candomblé. Nascia um tipo de cantora, absolutamente dramática, que em sua voz grave hipervalorizava os contornos fonéticos da palavra, pronúncia impecável, baseando-se em dizeres narrativos postos a contar histórias e a preservar tradições nas quais ela sempre acreditou como tradutoras de uma real brasilidade. O Brasil que ela insiste em cantar e perfilar como seu.
Hoje, Maria Bethânia tem 45 anos de carreira sem interrupções. A voz de 63 anos (fará 64 em 18 de junho deste ano) está apuradíssima e sob o total comando da sua vontade expressiva, do seu rigor e simplicidade estéticos, da sua força como intérprete, da sua fé e das suas idiossincrasias que a tornam uma das mais singulares artistas surgidas no cancioneiro brasileiro.
Seus motes musicais encontram fragmentos míticos da historicidade do seu Recôncavo na Bahia; o canto de Maria Bethânia lança luz sobre o povo negro que venceu a escravidão e mesmo ainda sofrendo perseguições ligadas à intolerância religiosa, manteve ativo o candomblé como uma das religiões mais representativas neste país. A voz desta mulher singra os mares da possibilidade expressiva na junção vital da sonoridade à palavra, que ela bem dita a favorecer a difusão do autoconhecimento entre nós brasileiros. A palavra entendida por ela como imprescindível à sua arte; ela que é incansável artífice do formato canção e fez dele também, instrumento de contação de histórias.
Saem do canto de Maria Bethânia escrituras, no mesmo tom autoral que seus compositores e escritores favoritos lhe entregam; escrituras de uma poeta que escreve com a voz naquela intensidade e verdade vistas na canção Palavra, de Moraes Moreira, que encerra o seu trabalho comemorativo de 25 anos.
Então, quando se ouve o canto narrativo de Maria Bethânia, pode-se afirmar: ali está o canto da griô, uma espécie de escritora vocal do Brasil. Atualmente, o maior artista da nossa canção afeito às suas luso-africanidades.
( Publicado no Terra Magazine em 21/04/2010)

Despedida, Rubem Braga



E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval — uma pessoa se perde da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais.
Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado — sem glória nem humilhação.Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?
Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras — com flores e cantos. O inverno — te lembras — nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil. Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus. A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo.
(Extraído do livro "A Traição das Elegantes", Editora Sabiá – Rio de Janeiro, 1967, pág. 83.)

P.S. : Enviada por Claudio Leal; momentos de conclusão e de algumas despedidas; esta crônica me levou a voz...

terça-feira, 20 de abril de 2010

Marlon Brando: acima dos sentidos



Dentro do mistério: mais talento que lindo. O ator. Querer profissional misturando a alma do segredo: desejo sexual movendo qualquer vida. Este nome naquele homem cara de cinema. O desfazer para ser cinza e renascer tempo eterno... O bem acima - imagem voz atuação. Mágicas masculinas que se estendem à ideia do diferente traduzindo-se mito marlon brando.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Maria Bethânia: tu és para mim


Silêncio!

Lady Laura e Roberto Carlos

das coisas desmedidas e absolutamente inexplicáveis:

"Tenho às vezes vontade de ser novamente um menino/ E na hora do meu desespero gritar por você/ Te pedir que me abrace e me leve de volta pra casa/ E me conte uma história bonita e me faça dormir".

domingo, 18 de abril de 2010

O compasso de Ângela Ro Ro

Ro Ro

Ela é um transbordo. Mistura de inteligência, talento, inadequação, vontades mil, rebeldia, tristeza e dor, cor e amor, escândalos. Uma das nossas melhores compositoras de todos os tempos e excelente cantora também. Sempre ensinou muita coisa a este país, querendo, juntamente com ele, dar certo nisso que buscamos sentir e realizar: a felicidade!
Ângela, desde sempre ícone lésbico; altiva mulher amante de outras; transgressiva artista, íntegra ao seu estado constante de poesia e outra sobrevivente da cena preconceituosa, homofóbica e careta brasileira, traços da esfera global; ela, Ângela, outra sobrevivente de si mesma. Contínua intensidade do tipo: vou doer para fazer luz. Seu compasso melhor é a sua música. Ouvi-la falar é rir em aclive na vida, dispensando os mais sérios. Ângela é um jeito perigoso de amar ( como se amar tivesse algum jeito protegido). Sua presença estaria aos holofotes midiáticos como algo óbvio e infame traduzido pelo que querem do universo lésbico. Como todos nós, seres humanos gays ou não, Ro Ro é gargalhada e mistério fazendo da sua vida lítero-musicalidades que animam, em dor e alegria, a alma brasileira.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Da infância pelo mundo

Moçambique
Bolívia
Eu prestando atenção numa ávida vontade de acreditar em algum sentido que espelhe o humano. Notadamente a criança aparece como esperança e me leva a rezar por mim e mais ainda por elas mesmas, crianças... Que tenham vida plena em sua delicadeza e seu caminho como adultos reflita respeito pelas diferenças, mais suavidade, coletivas realizações, a força das cores, amor sendo mais, saúde, o fim da pobreza, a minimização do dinheiro, sabedoria, risos e lágrimas; tenha muito, muito: arte. E fé.
Ao meio desta loucura, lacunas, desespero, eu me banho de fé e sonho feito criança tentando um encontro sereno comigo mesmo. Que não me arranquem de mim e que eu faça das palavras às minhas atitudes encontro amoroso com esta vida que passa degastando agente. Eu tenho fé e há no mundo crianças golfinhos poetas cantoras escritores iyalorixás vento folha terra fogo ar água... Há o mar de mim no mundo... Fé para que se possa melhorar dentro dos estímulos ao necessário amor que nos busca ocupar...

terça-feira, 13 de abril de 2010

Minorar

Seus olhos não saíam do entreaberto da porta e fixos, deveriam encontrar. Queriam atingir o átimo de tempo da possível chegada que pioraria a sua sofreguidão. Mas tinha que vir para finalizar o enredo duradouro de antes... Os olhos não mais suportariam a inércia como resposta e esta força da espera do nunca mais misturando-se ao pode chegar a qualquer momento. Tormento ocular maior que miopia catarata glaucoma conjuntivite esperança...
- Volta, entra e sangra esta vontade de tê-lo aqui por perto. Diz-me não de vez e saia batendo a porta para o sempre que me aliviará desta fixação inócua representada pelo estacionamento do meu olhar frente ao que foi a entrada da nossa casa. Devolva-me, assim, a minha vida.

Márcia Short canta em Portugal

Márcia leva sua expressão de ouro para os lusitanos


Sou fã, o que não poderia deixar de ser. E torço para que o mundo reconheça o brilho de beleza do canto de Márcia Short... Moradora da Bahia, experiente carnavalesca, mas acima de tudo: uma da melhores cantoras brasileiras. Sorte, Márcia. Que neste abril estará:
" em Portugal dos dias 12 a 24 de Abril representando a música da Bahia a convite do Festival Gastronômico da Bahia. Apresenta-se de 14 a 17 de Abril no Porto e de 21 a 24 Abril em Lisboa. As mostras gastronômicas realizam-se no Vila Galé Porto e no Vila Galé Ópera, em parceria com a Bahiatursa. "
- "Da saudade o que mais tenho/O seu amor é o que mais sei".

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Além do porto


"Das raras velas que chegam

Nenhuma chega por mim".


Os olhos fitam o horizonte sem chegada.

Marca o tempo a passagem dos sonhos.

O mundo em retirada acima dos montes

E o mar como beleza e aprisionamento.

A boca ornada pelo vento marulha

Vontades úmidas em outra;

Viver é passatempo sem escalas,

É ser fruto das vãs lições,

É não ter o que transgredir,

É ser rota sem parada,

É amar sem sentir.

Os olhos que embarcam e pedem

Morada para o carinho errante...

Mão cansada da solidão do toque

Música ímpar desperdiçada

E o corte, o corte, a morte...

Princípio da saudade pedra-mar.

E Deus criou Maria Bethânia...


Maria


Bethânia

Mais uma vez ela arrasou em São Paulo. Amor Festa Devoção singra entre os melhores shows de Maria Bethânia e como é agradável assistir aquela bela homenagem à dona Canô e à cultura brasileira.
Ele, meu amigo, Cláudio Leal, me ligou vaticinando: " Não tem jeito, sua musa é a número 1 do Brasil!"; olha só quem disse isso: nosso menino de ouro do jornalismo! Pra completar a minha euforia, Leal me enviou as fotos acima clicadas por ele mesmo. Quanta alegria. E ela, altiva inspiração em minha vida, já faz falta nessa cidade da qual nós três ( eu, ela, Cláudio) fazemos parte...
Para a arte do Brasil: Deus criou Maria Bethânia. Imbativelmente, a melhor!

domingo, 11 de abril de 2010

Gal toda Azul


"Se acaso anoitecer
E o céu perder o azul
Entre o mar e o entardecer
Alga marinha, vá na maresia
Buscar ali um cheiro de azul
Essa cor não sai de mim"
Da voz mais azul do Brasil para o centro do meu dia em marasmo. Sou solar, quero o mar e sonhar pelos reflexos desta cor que não sai de mim. Da voz de cantora para o meu peito de poeta inspirado pelo frio mas ansioso pelo cheiro da cerveja nos bares em dias de sol nesta Cidade da Bahia. É como alcançar os ares subindo de esperança pela sonoridade Gal Costa e me ter com a felicidade doce que a canção traz... Imagem de Gal mais azulzinha. Chove na Bahia.

sábado, 10 de abril de 2010

Da alma sob chuva

"E faz-se a canção
do inverno assim:
com as cinzas da chuva
e o frio de mim".
Ruy Espinheira Filho



Me desenho nos escritos a lápis abaixo de um tempo que molha.
Faz silêncio lá fora. Aqui, bem de dentro, o mundo me mastiga
e barulha sobre o meu lamento.

Faz noite. As estrelas se foram no percurso da minha melancolia.
Tudo se movimenta em lentidão a respeitar
o silêncio lá fora.

Me aguardo nas respostas que me pus a esperar.
Não há nada que eu mesmo no exterior de mim.

Secura ávida numa falta de encontro.
O exagero de uma alma além do diferente.
E nomes terminados em mar.

Agora chove. O silêncio é água nesta
minha vida que não sabe navegar.

Me afogo no desenho a lápis:
tudo me rabisca e não se conclui...

A chuva me ultrapassa e me aparta
de qualquer solidão acompanhada.

Estou-me em mim ancorado no vazio
infindável deste tempo que me escapa.
Tenho a coragem dos pássaros enfrentando
invernos rigorosos.

O que me apaga é a borracha da
existência que eu mesmo escolhi.

Faz frio apesar de sábado.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Dos filhos dela


"Arquétipo: Voluntariosos, fortes, rigorosos, protetores, altivos e algumas vezes, impetuosos e arrogantes. Têm sentido de hierarquia, fazem-se respeitar, são justos e formais. Põem a prova as amizades que lhe são devotadas, custam muito a perdoar uma ofensa e se perdoam, não esquecem jamais. Preocupam-se com os outros, são maternais e sérios. Sem possuírem a vaidade de Oxum, gostam do luxo, dos tecidos azuis e vistosos, das jóias caras. tem tendência a vida suntuosa, mesmo se as possibilidades não lhe permitam tal fausto."

Candomblé


Esse sentido coletivo de uma religião, que em mim, tem sido cada vez mais individual... Meu olhar de amor e pelos orixás... Algumas sutilezas que me fascinam e me desenham nessa ambiência do se querer acreditar... Dança no real de mim: Ogunté e Guian. Âmagos do que realmente sou...

terça-feira, 6 de abril de 2010

Billie Holiday : 95 anos

Amanhã, 07 de abril, dia do jornalista, dia do nascimento de Billie Holiday... Símbolo do que nunca morre... Espécie do grude Diva Vieira Passos - duas mulheres com a cara igual de histórias desiguais e sendo no meu íntimo a mesma coisa... Billie, o canto supremo, a maior cantora de todos os tempos e essa minha desrazão, emoção sequencial Maria Bethânia, Gal Costa, Elis Regina, Jussara Silveira, Adriana Calcanhotto, Norah Jones... Tiganá Santana. Falta da desnecessária explicação... Minha noção melhor do silêncio na nítida sensação do amor que me norteia... Só sou saudade, homem repartido mas amei como menino - inocente vívido doce, querendo o mais doce dos olhos acima do mais doce que poderia ter. Era castanho. E Billie se nos faz assim ressuscitar. My love for sale... Vendas de mim mesmo, vãs vãs vãs...

Maria Bethânia: Palavras

Maria

Ela deveria ser a cantora maior de qualquer escritor, já que nos delicia, em sua pronúncia rara, com a beleza maior que a palavra instaura. Mulher que ruge delicadezas em récitas da precisão. Eu a ouço como um aprendiz da fala e escrevo, humilde e imaginariamente, sobre o sublime que se rasga em sons da sua garganta. Quem se atreve a dizer poesias à frente de Bethânia se adianta para a anulação. A mulher oxigena as palavras e sua história de griô correlaciona-se com os feitos poéticos do feminino em Lesbos, esta Maria é legado humano greco-africano; naquela voz tudo é um drama inclinado a magnetizar seus ouvintes e a romper fronteiras: quando começa o literário e quando termina o musical? O que é teatro e o que é música e o que é poesia na voz desta cantora?
Maria Bethânia, artífice condutor do que um idioma pode guardar e traduzir desta gente luso-brasileira.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Billie Holiday: começo meio fim

Lady Day

Como se dentro do sereno, estivesse fazendo muito frio, a alma nada agasalhada, mas a beleza reinando e a vida, por causa disto, sendo salva. A beleza descrita na voz que faz inverno... Os lados desérticos num código de grandeza feminina à posse do mundo. O rosto maior que a dor. Trajetórias de invenção para o mito: aparentes derrotas no que tange navegar... O mundo. Dói em fingimento, em alegoria, em poesia, em busca, em tormento. E a mulher canta. Parindo destinos, o seu filho eternidade... Aquilo do olho em abandono mas sem saudade. E a dança das mãos à procura. Joelho no outro do outro e ventando. Trompete ou sax na garganta humana? Como cantar daquele jeito numa peformance insuperável? Debaixo do sol muito gelo. Neve esvaindo-se de canções. O olho de quem escreve lotando-se de saudade. Circulares da dor. O que está abaixo da tristeza e emerge pelo talento. Senhora dos dias em sua vida de duras noites. Glória mortífera notívaga do amor cessando. Frio que é bom. Frio que é mau. Alcance na eletrola acompanhada de álcool. Vinho da melhor safra. Chegada insuportável. Paisagens urbanas e ela tão acima, tão distinta, criatura dos sofreres, diva da legítima realeza; mulher prostituída sobre a mesa dos melhores paladares. O preço que não se paga. Algo que já se foi e para o continuum da música será sempre começo meio fim. Desfecho que nega lógicas e sabota as lições de erros e acertos. Ela é Billie Holiday.

domingo, 4 de abril de 2010

Ócio dos gênios: Clarice Lispector e Billie Holiday

Clarice
Billie
Tal vez foi descontração. Elas imprimindo-se em fotos. Com o peso da impossível normalidade. Vez do quase descuido inumano. Manhã de domingo refazendo sonhos apesar da dor. Escritos incisivos d'uma n'outra a voz do mais amplo sentido. Em ambas, manhã da total beleza. Vez outra chega nobreza, quando uma posa branca e a outra negra, fuma... Lindeza do que se encanta em voz e escritos e elas, mulheres queimando: fogo sagrado da sedução... A bela face feminina íntegra aos prazeres e dores.
"Sentia o mundo palpitar docemente em seu peito, doía-lhe o corpo como se nele suportasse a feminilidade de todas as mulheres".

"Não acho que estou cantando. Sinto-me como se estivesse tocando trompete. Procuro improvisar como Les Young, como Louis Armstrong ou alguém que admiro. O que vem é o que sinto. Na realidade, detesto cantar por cantar. Tenho de adaptar a melodia ao meu próprio modo de cantar. É tudo o que sei".
"Fique de vez em quando sozinho, senão você será submergido. Até o amor excessivo dos outros pode submergir uma pessoa".
"Maybe
I shall meet him Sunday
Maybe monday, maybe not
Still I'm sure
To meet him one day
Maybe Tuesday
Will be my good news day"
"Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma".
"Take me back, I love you
... I need you
I know it's wrong, it must be wrong
But right or wrong I can't get along
Without you".

Ecos da liberdade



Haveria de existir a teletransportação, o que em muito dimunuíria esta sensação de vazio... Imaginar e alcançar os Alpes Suíços, o litoral italiano, o antigo Egito, o atual Níger, Abeokutá, as ruas de Paris, o Paraguaçu em Cachoeira, o azul de Istambul e a diversidade de Nova York. Deveria. Viajar pelo tempo e espaço e bater um papo amargurado com Fernando Pessoa e sentir medo e adoração frente a Clarice Lispector. Dar um Iká aos pés de Mãe Aninha de Afonjá e assistir Elis Regina em Falso Brilhante. Ouvir vendo Maria Callas. Muito mais perto: os Doces Bárbaros e os Novos Baianos; beijar Marlon Brando e viver ao lado de Billie Holiday. Caminhar ao lado de Jorge Amado sentindo a sua Bahia e pedir a Caymmi uma canção para minha Iemanjá.
Haveria, em nós, de existir o alcance maior e a gente ver o mundo dias após nossa própria morte e voltar ao tempo presente compreendendo mais.
Gritaria em cada canto do mundo: mais poesia mais poesia mais poesia. Beleza em nossos dias e o peito humano rindo de doçura e sem tantas lacunas que enfurecem a vida e dilaceram bons instantes, as tais horinhas descuidadas fazedoras de alegria.
Haveria de ser pura mágica na noção de cotidiano... Todo dia se salvar em palavras sons imagens amizades amor culto fé... Poetar do Olimpo conversando com Zeus e ele me permitindo gritar liberdades. Eu trovejar, atiçar os mares, ventar contra a violência e a insatisfação gratuita; liquefazer instantes dando e tendo prazer no que pode o corpo e a palavra. Muitos poemas refrescantes neste calor escaldante gerado por nossa genérica infelicidade. Poemas para árvores mares idosos crianças mulheres alguns homens sem as marcas das raças mas idílicos na saga ideal do que poderia ser isso ser humano...
Queria a teletransportação para dentro do amor profundo, entrega inteira e o susto da intensa felicidade.

Ainda mistério


Sim. Estamos todos na lama. Mas eu com fé e doçura insisto em olhar para as estrelas. Por que não?

sábado, 3 de abril de 2010

Sobre o nada


Antes de tudo
Tudo era meu
Mas eu não tinha
Com quem dividir.

Minha desgraça




Minha desgraça não é ser poeta
Nem na terra de amor não ter um eco,
E meu anjo de Deus, o meu planeta
Tratar-me como se trata um boneco...
Não é andar de cotovelos rotos,
Ter duro como pedra o travesseiro...
Eu sei... o mundo é um lodaçal perdido
Cujo o sol ( quem mo dera!) é o dinheiro...
Minha desgraça, ô cândida donzela,
O que faz que o meu peito blasfema
É ter para escrever todo um poema
E não ter nenhum vintém para uma vela.
Álvares de Azevedo

Domingo de Páscoa

Tenho cá dentro de mim centenas de perguntas dilacerantes e algumas certezas que me tiram o sabor da vida. Queima-me , aqui e agora, a fagulha impura dos mais infelizes; os desinfelizes que se cobrem todos de projetos de vingança e, terroristas da própria sorte, subvertem o encontro, aceleram, em conflitos banais, a morte e não calam mesmo sem ter o que falar.
Propagadores do quase-caos porque neles nada pode ser inteiro e a metade é lida por eles, quase trogloditas, em todos que escapam de suas migalhas explicativas nascidas dos seus insucessos sócio-existenciais. Difundidores do acertado maltrato e criadores de buracos na alma de quem ainda enxerga e gera poesia.
Inspiradores dos escritos malditos - os melhores, é claro! - e fazedores de estúpidos barulhos que violentam a fé silenciosa de quem espera da vida, e do mundo, mais fruição intuição sensibilidade coragem clareza e coletivas realizações.
Esse é o retrato do que será o Domingo de Páscoa sob a chuva e a diversidade na Cidade da Bahia!

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Tristeza

"Tomara
Que a tristeza te convença
Que a saudade não compensa
E que a ausência não dá paz
E o verdadeiro amor de quem se ama
Tece a mesma antiga trama
Que não se desfaz

E a coisa mais divina
Que há no mundo
É viver cada segundo
Como nunca mais..."
V M

E a pior dor é a de ter novelos de palavras e não ter a quem dedicá-las inteiramente. É fazer silêncio e fazer barulho e ser pessoa alheia à atenção de alguém: a pior dor é deserto cheio de gente quando todos seguem indo-se. Um vento danado sem refrescar e há a fala brotando palavra sendo água na quentura que ao invés de salvar, toda palavra água, afoga meio morte quase vida e tudo dói como música na fita que não soube alcançar. Esses dias do assim sem sim - o mundo descritivo, meros palavreados para aquilo que há porque não há sentido. Vaga na retórica: imensa distância fazendo doer demais... Agora não há por quem sentir saudades, por quem idealizar verdades, riscar o chão das ruas abaixo da lua pedindo pra voltar; agora o peito está seco da ânsia que era amor e se vestia de azul, tocava violão, escrevia, desenhava, sorria, cantava, vivia espelindo luz castanha e... Nem há lembrança mais. O tempo venceu dilacerando a cidade submetida às águas de uma canção que deveria ser eterna. Restou a árida seca que norteia a noite desta tristeza lenta e em paz... O pensamento sem ter em quem pensar e nem perfume, nem música, nem palavra poética retorna o brio desesperado de um amor que todo dia se fazia Primavera. Uma trilha magistral na voz de Maria.