A história é a face incógnita da coletividade. Mas, também
fragmenta e visibiliza exemplos e dar nomes, às vezes, a quem merece ser
nomeado. Pensando na história social da Música Popular Brasileira, me pergunto
da longevidade e dos efeitos das carreiras de Gil e Caetano. Dos impactos
estéticos, comportamentais e políticos. É claro que discordo de muitas posturas
de ambos. Contudo, mais forte em mim é a força transformadora e educativa,
poética e literal, das canções que nos impulsionaram a um Brasil mais astuto,
mais diverso, mais exigente, pena que não menos desigual.
Talvez, ao envelhecer, Caetano seja um senhor do Leblon, em
muitos aspectos, no Rio de Janeiro, e Gil o dono do Camarote – em dicotomias
sociais no Carnaval da Bahia. Mas nem aí eles deixam de ser monumento
indestrutível do poder criativo que nossa música popular, configurada neles,
teve e ainda tem. Nem o topo do conforto que o lucro capitalista engendra e
paga (no caso deles) acertadamente, esvazia suas trajetórias que esparramam
luz, reflexão, prazer, silêncio, orgulho, vontade de ser, luta para amar,
solidão, turbas ardentes, encontro de raças e coisas que até, novamente, às
vezes, não compreendemos.
Em Gil e Caetano, a mulher faria uma revolução para salvar a
ela e ao homem. A palavra seria para todos espada e ungüento, alívio e torpor,
seria este movimento que eles deram e dão à vida racional e sentimental de
todos nós. Seríamos um país pela inteligência a cavoucar nossos defeitos e
destacar as qualidades. Faríamos a nossa universalidade sem sair de nossas
cidades, entre os espectros da pobreza e a beleza da criatividade.
Em Gil e Caetano, o tempo funcionaria pra permitir a vida.
Teríamos o mais que humano em nós porque já saberíamos, mesmo em contrastes, a
ter humanidade. E Lá no fundo, cheios de fé, diríamos: mistério sempre há de
pintar por aí. E por aqui.
Marlon Marcos é jornalista e antropólogo email: ogunte21@yahoo.com.br
(Publicado em 09/04/2016, no Opinião do Jornal A Tarde, p.02)