terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Da poesia

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e
pousam no livro que lês.
Quando fechas o livro,
eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto;
alimentam-se um instante
em cada par de mãos e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...

Mário Quintana

Mário Quintana


"Se me esqueceres, só uma coisa, esquece-me bem devagarinho."

Que me venha de Iemanjá esta vontade aquática de continuar sonhando e realizando. Vontade de voar como se estivesse nadando as águas de mim; eu dono de tudo que tenho para oferecer e renascer pleno no vazio do que ofertei a quem por mim passou e eu amei. 2009 - meu nome é .

Da delicadeza


Hoje eu precisei traduzir com exatidão a delicadeza. Como estava inspirado, arrematei:
Clarice Lispector escrevinhando o cotidiano humano frente ao visível mundo do que não é humano. E depois, para além do que com carinho toca a minha memória, delicado são os olhos castanhos em lágrimas do humano de asas que marcou indelevelmente o meu caminho. Menino Deus.
Eis a delicadeza em precisão.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Avareza


Clarices
"Ter nascido me estragou a saúde"

sábado, 20 de dezembro de 2008

Fatal

Penélope Cruz
A vida é um mistério em muitos desalinhos. Sobrepõe, ao menos em mim, muitas das racionais explicações que nos governam há séculos. É preciso que haja o choque, a transgressão, a presença do impossível acontecendo para que, de fato, a humanidade caminhe, respire, crie, acredite e realize. Se nos bastasse a razão e elucidações científicas, viver seria um fardo esculpido em tédio e previsão. O desbunde e o inesperado bom ( às vezes o mau) traz vida à nossa existência. Tipo Esotérico, a canção de Gil, é a mão e olhos e o jeito da diretora Isabel Coixet de narrar pequenas maravilhas para nossa diversão e aprendizagem.
É assim: Fatal, o filme, é uma óbvia aprendizagem, erguida da categoria de quem sabe expressar beleza. Traz o imaginado, o dito imprevisto visto com previsão, numa luminescência de dor e alegria, que dela, Coixet, já tínhamos experimentado em agonia com o belo Minha vida sem mim.

Chorei e sorri. Como Penélope é linda. Como o mistério da vida é saboroso e como o magnífico Ben kingsley é sensual e desejável navegando a terceira idade. A tristeza é mágica e criadora e nós somos nisso tudo: uma grande bobagem.


Para instantes de conclusão

O sol sobre o mar e eu em alguns instantes da necessária e absoluta conclusão.
Um dia que me toma para que eu possa acarinhar. Mais um dia de entrega minha.
Nos arredores do meu pensamento minha ânsia de mudança e a esfera do meu caminho.
Faço frases que eu possa respirar antes e depois decidir. Há esperança em mim.
O movimento de ontem ressoa na manhã de agora e eu sigo assim:
Ventando forte dentro do mar de mim mesmo e conseguindo, insistindo em viver sereno.
Versos fracos para expressar o tamanho do que tenho pra dar.
Tudo em mim sou eu mesmo - pequeno - mas, imprescindível.
Agora, não.
Depois, sim.
Sim.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Contra o tempo

Rita Ribeiro
Pra' ocê
Corro contra o tempo
Prá te ver
Eu vivo louco
Por querer você
Oh! Oh! Oh! Oh!
Morro de saudade
A culpa é sua...
Bares, ruas, estradas
Desertos, luas
Que atravesso
Em noites nuas
Oh! Oh! Oh! Oh!
Só me levam
Pra onde está você...
O vento que sopra
Meu rosto cega
Só o seu calor me leva
Oh! Oh! Oh! Oh!
Numa estrela
Prá lembrança sua...
O que sou?
Onde vou?
Tudo em vão!
Tempo de silêncio
E solidão...(2x)
O mundo gira sempre
Em seu sentido
Tem a cor
Do seu vestido azul
Oh! Oh! Oh! Oh!
Todo atalho finda
Em seu sorriso nu...
Na madrugada
Uma balada soul
Um som assim
Meio que rock in roll
Oh! Oh! Oh! Oh!
]Só me serve
Pra lembrar você...
Qualquer canção
Que eu faça
Tem sua cara
Rima rica, jóia rara
Oh! Oh! Oh! Oh!
Tempestade louca
No Saara....
O que sou?
Onde vou?
Tudo em vão!
Tempo de silêncio
E solidão...(2x)
Vander Lee

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Ethan Hawke (III)

Psiu!!!!!!!(Silence, please!)

sábado, 13 de dezembro de 2008

Maria e Vieira : encontro na palavra

Maria Bethânia

Foi na noite do dia 10 de dezembro de 2008, na nave central, no altar-mor, da quatrocentona Igreja da Misericórdia, na Cidade da Bahia, em homenagem ao ícone da língua portuguesa, o padre Antonio Vieira, festejando os seus lendários quatrocentos anos, que Maria fez mais um projeto especial: um show longo, mesclando o universo sagrado do candomblé com o do católico, de modo impecável, e como sempre, também desfiou canções sagradas do cancioneiro brasileiro e recitou textos como só ela sabe fazer aqui neste nosso Brasil.

Mais uma réstia de luz sobre as sombras dos anos atuais. Mais um exemplo da navegação de beleza que esta senhora imputa à sua carreira. Mais uma vez, pela correnteza de força e frescor daquela voz, alguns privilegiados assitiram ao Brasil que dá certo. Ela, tão respeitosa intérprete dos mistérios da Fé, aos pés de Nossa Senhora, rezando canções, perfilou a grandeza da cultura que nos permite sonhar com um país melhor.

O ingresso foi caríssimo. Afugentou muita gente, inclusive a mim, mas a homenagem honrou a nossa tradição popular: Dona Bethânia no centro católico do Brasil gritando: " Eu sou o céu para suas tempestades/Deusa pagã dos relâmpagos/ Das chuvas de todo ano/ Dentro de mim". Revigorando a santificação de entes caros para todos nós: Santa Bárbara e São Jorge!

Luminescência pura e perfumada de azul. O canto sublime do artista longevo mais criativo em tempos atuais. Sibilares da vontade dos deuses de terem Maria como sua porta-voz mais legítima e preparada. As fotos são da escritora Maria Sampaio. E, segundo o doce Rodrigo Velloso, as imagens foram feitas por Bia Lessa, o que pode nos assegurar mais um registro artístico, em audio- visual, das performances memoráveis da nossa Maricotinha.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Pétala por Pétala

Chico César
Pra o'cê
a sua falta me fez ver
o que de mau a vida pode ter
e a sua volta me dá mais
de todo o mel que eu ousaria querer
sua presença me faz rir
dos dias feitos pra chover
nao há revolta pra sentir
nem há milagre pra não crer
vinda que finda
a tinta de pintar tristeza
deixa os mistérios plenos de sentido
e a flor da vida toda
pétala por pétala
que um tolo pode colher
sem saber que é amor
vem e aumenta em mimo único que sou
me subtrai do que em mim passou
é amor, vem.
(chico césar / vanessa bumagny)

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Água Viva


A pintora-missivista, Água Viva

“Olha para mim e me ama.
Não: tu olhas para ti e te amas.
É o que está certo.”
( Clarice Lispector, Água Viva).

O livro Água Viva foi publicado em 1973. Um texto que narra a história de uma pintora, que mergulhada em lembranças da sua relação amorosa desfeita, resolve inusitadamente escrever para o ex-amante e constrói uma carta-despedida que se tornou a mais bonita missiva da literatura brasileira até então.
O nome da personagem não aparece na história, que narrada em primeira pessoa vai desenhar dentro de sofisticada linguagem, um quadro de dilacerante despedida e revelar os caminhos criativos de uma escrita erguida da esmagadora solidão. Um texto muito distante de narrar linearmente uma história, talvez seja mesmo uma narrativa sem história que envolve o leitor em uma teia de sentimentos e sensações provocadas pelas imagens pintadas por palavras, imagens que iluminam a percepção e que conduzem o leitor a re-criar através da imaginação novas possibilidades de histórias dentro do livro agora analisado.
É uma discursiva assumidamente feminina, na qual os hábitos e costumes da narradora reforçam a idéia da sua condição sexual e reitera os construtos simbólicos que representam a mulher no âmbito da cultura ocidental. Um livro que paradigmaticamente se insurge contra os escritos clariceanos anteriores, e se apresenta como um grande poema, ou melhor, como exemplo de uma belíssima prosa-poética em digressões sobre as sensações e as percepções do indivíduo feminino:
“Ouve-me então com teu corpo inteiro.
Quando vieres a me ler perguntarás por
que não me restrinjo à pintura e às minhas
exposições, já que escrevo tosco e sem
ordem. É que agora sinto necessidade de
palavras – e é novo para mim o que
escrevo porque minha verdadeira palavra
foi até agora intocada. A palavra é
a minha quarta dimensão”(p.10).

É mais uma história de amor clariceana, expressando pelas entrelinhas, ou mesmo, pela liberdade interpretativa do leitor, um universo de sentimentos antagônicos que agonizam e revigoram a pintora-missivista, dedicada a escrever como se estivesse a falar, ou até mesmo a pintar, contra o silêncio exercido por ela, talvez, durante a existência de sua relação amorosa. Escrever/falar para negar os erros cometidos no passado e se sentir mais inteira diante de si, recuperando assim a integridade da sua identidade perante os escombros gerados sócio-existencialmente por uma separação.
Escrever para passar o tempo e vencer a saudade, que persiste diante da solidão. E deste ato de escritura experenciar o “enfeitiçamento” que acomete a narradora de uma “verborréia” imagética e a faz construir outra realidade, que se traduz assim:
“Não quero ter a terrível limitação de quem
vive apenas do que é passível de se fazer
sentido .Eu não: quero uma verdade
inventada.”(p.20).

Entre as três personagens discutidas até aqui, há a necessidade de consolidação identitária. As três são mulheres da classe média, instruídas, urbanas, que vivenciam suas experiências femininas em um nível razoável de consciência, e se questionam sobre a realidade, sobre a existência e as motivações pessoais (e coletivas) que podem conferir sentido à vida humana.
Permeando as histórias de GH, de Lóri e da Pintora-missivista, estão questionamentos recorrentes ao universo feminino: a descoberta de si, a entrega amorosa, a maternidade, o encontro com o outro, o desencontro e a solidão. Traços de uma poética-construção da história da mulher em suas variantes sócio-culturais, mas convergentes quando explicam o processo de “feminilização” da fêmea humana.
E como apetrecho poético, a narradora de Água Viva encerra a sua carta-poema lotada de definições identitárias dirigindo-se ao outro, consciente de si:

“E eis que depois de uma tarde de ‘quem
sou eu’ e de acordar à uma hora da
madrugada ainda em desespero – eis que
às três horas da madrugada acordei e me
encontrei. Fui ao encontro de mim.
Calma, alegre, plenitude sem
Fulminação. Simplesmente eu sou eu.
E você é você. É vasto, vai durar.
(...)
O que te escrevo continua e estou
enfeitiçada.”(p.87).

Então o amor se desconstrói, mas prossegue em encantamento.
P.S.: Hoje ela faz 88 anos. Bravíssima!

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Norah Jones


E tão docemente ela apareceu em 2003 e alegria e "delícia" trouxe aos meus ouvidos. A voz afinada e a cara de brasileira linda - me pareceu uma baiana criada no Rio de Janeiro. E bela. Desejável como poucas. Uma incursão minha em loucuras amorosas e ,toda ela, Norah, como trilha sonora melhor. Foi um sonho de felicidade, vivido, algumas vezes, embaixo de fininhos lençóis... Uma música miscigenada apontada para o Jazz , num ritmo Billie Holiday, raios bethânicos e a vida singrando-me em satisfação. Norah prossegue. Grande cantora e pousando no cinema. Sua pequena discografia é um emblema do seu raro talento. Ouvi-la sempre me faz bem e o corpo, além do espírito, muito agradece.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Vanessa da Mata


Hoje,
Manhã com o cheiro de vanessinha - coisa quente e doce.
Jeito de aconchego e aconchego de mulher. Inteirezas do humano que Deus fez melhor.
Mulher. E Vanessa da Mata cantando à luz da sua beleza. Destreza. Gostosura intra-sensorial.
As mãos tocando - me vermelho e a canção que sente vida.
Não sei se é um dia de alegria. Começou com ela me acordando e eu me enchi de desejo.
Um bom dia vanessinha e eu tenho três CD's dela para escutar.

domingo, 7 de dezembro de 2008

Brad

Era mil novecentos e noventa e nove e alguma coisa na cabeça. Uma presença masculina não branca e quase adulta aquecendo a vontade de ter perto o corpo dele já que ele existia no coração. Era o traço da beleza sublime no caminhar do menino que ia sem voltar. Menino sem juízo na mente sangrando. Eram dois olhos castanhos vindo na percepção do que foi pelo correio. Brad - imagem da representação bem menor, em beleza, no tudo que era ele aos olhos daqui.
Esses assombros eternos da vida e românticos porque os corpos não se experimentaram.
E Brad é essa absurda representação do que melhor só vindo dele. O menino deus.

sábado, 6 de dezembro de 2008

Maria


Ver e ...basta!

Realce


Foto: Lita Cerqueira, 1978. Fonte - Terra Magazine.
Não sei se medo ou se proteção
O olho que vem do mistério
E que pára no meio do caminho.
Não sei se extraio a beleza
Ou grito a denúncia
Se vibro em silêncio
Se dasatino a falar sozinho.
O que eu olho mas não vejo
Na imagem d'água que me ocupa?
Brilham trilhas sonoras na retina da menina
- Toda menina baiana -
Ano de 1979
Peso imagético da esperança
Que a câmera vê e realça.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Salve Santa Bárbara!

Terceira homenagem 2008
Os dias 04 de dezembro, na minha infância, sempre eram os mais esperados por mim. Era dia de vermelho, de comprar roupa nova, sentir o cheiro das flores, ver todo mundo lá em casa preparando o caruru, saborear o azeite, louvar os santos e os orixás, rezar para Santa Bárbara...Acreditar que as coisas poderiam ficar melhores. Dia 04 era, e ainda é, símbolo de festa e esperança. Mas, o melhor era ver D. Diva de saia rodada vermelha, bata branca, contas de Oyá e Xangô, pronta para entregar-se ao seu culto de amor religioso que muito me contaminou e por isso, tão fortemente por isso, sou devoto de Santa Bárbara e vibro com o início de dezembro à luz do verão da Bahia, que nesses dias acomete-se de raios e trovoadas. A presença de Santa Bárbara e Iansã é sempre revelada... Como dizem alguns: Bárbara é protegida de Oyá, então, Eparrei às duas!!!
P.S.: É bom sentir felicidade! E ter Fé!

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Iansã

Segunda homenagem de 2008
"Para onde vai a minha vida e quem a leva?Porque eu faço sempre o que não queria?Que destino contínuo se passa em mim na treva?Que parte de mim, que eu desconheço, é que me guia?"
Maria Bethânia de Oyá
Senhora das nuvens de chumbo

Senhora do mundo dentro de mim

Rainha dos raios, rainha dos raios
Rainha dos raios, tempo bom, tempo ruim

Senhora das chuvas de junho

Senhora de tudo dentro de mim

Rainha dos raios, rainha dos raios

Rainha dos raios, tempo bom, tempo ruim

Eu sou o céu para as tuas tempestades

Um céu partido ao meio no meio da tarde

Eu sou um céu para as tuas tempestades
Deusa pagã dos relâmpagos

Das chuvas de todo ano

Dentro de mim, dentro de mim
Gilberto Gil e Caetano Veloso
P.S.: Amanhã é 04 de dezembro, é dia de Santa Bárbara!

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Primeira homenagem 2008
“Salve salve deusa musa
Teu vermelho de sangue quente
Tua força de cerrar os dentes

Os pulsos abertos
Derramando trovoadas
A magnética luz
Das entranhas do céu

Rebolas impassível
Sob o filete rubro
Dos amores rasgados”.
Vitor Carmezim

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Guimarães Rosa


Há lugares que são pura inventividade.
Transbordam de tudo que nos alimentam.
Reinventam a vida, pois reinventam o olhar.
Lugares do Rosa da alma da língua em silêncio.
A palavra sonhando e trazendo o vento da inspiração.
Palavra movimento em minímas especulações,
Que desafia a norma dominando-a e tudo de tão grande...
É mais que pequenininho - voz da criança de lá
Iluminando as tentativas da criança de cá...
Luz e estesia em livros sagrados.
Lugares do Rosa no centro do coração.
Violação dos textos-cabeça.
Palavra que incita e cria pernas e braços e mãos
E viram asas transmutando horizontes.
Lugares das horinhas tristinhas da solidão
Mas a vida só não seria
Se eles não abrigassem a nossa imaginação.
Eu recebo o Rosa dos meus instantes,
E me sou todinho o amor daquela delicadeza.

sábado, 29 de novembro de 2008

Os azuis de Jenner Augusto

Alagado Azul

Uma devida homenagem se cumpriu. Por quase quatro meses, a Sala de Arte Contemporânea (SAC), do Palacete das Artes Rodin Bahia, abrigou as mais representativas obras de Jenner Augusto, ilustríssimo pintor brasileiro, nascido em Sergipe, mas radicado em Salvador, homenageado por uma iniciativa de Murilo Ribeiro, outro expoente das artes plásticas no Brasil, que é o atual diretor do Palacete. Com a colaboração do governo do Estado, da Secretaria de Cultura e do Ipac, mais a curadoria impecável de Zeca Fernandes, neto do artista em questão, promoveu-se a vitoriosa mostra Da natureza em busca da cor.

O nobilíssimo espaço da SAC foi acrescido de beleza por 92 quadros que dão a exata dimensão do trabalho de Jenner e perfilam a sua força criadora em relação à combinação de cores e formas que garantem a elegante expressividade deste artista. O jovem museu é inclinado a espelhar as obras consolidadas em nosso tempo, em várias linguagens, a fim de promover processos educativos entre o público estudantil deste Estado, de dinamizar a noção e os valores em torno das artes plásticas, de cultivar o espírito investigativo e despertar, entre nós, a vontade de se divertir e aprender dentro das esferas museológicas.

Jenner Augusto, em sua cadência azulada, foi outro trunfo favorável à atração de públicos para o Palacete. Uma obra consagrada e validada nacional e internacionalmente, que arregimentou fãs da estatura de Jorge Amado, Érico Verissimo, Carlos Drummond de Andrade, Vinicius de Moraes, dentre tantos outros; uma obra fazedora de denúncias contra as injustiças sociais, que nunca perdeu a leveza e fez poesia com as tristezas geradas por realidades erguidas da pobreza que cerca os nordestinos e todos os brasileiros.

Em uma trajetória de sucesso, Jenner Augusto coloriu o Brasil, sendo comparado a Candido Portinari, na época em que Jenner criou a chamada fase Retirantes do Nordeste e pintou a dura saga dos retirantes e sobreviventes desta região brasileira, indo ao encontro, do ponto de vista artístico, da literatura de Graciliano Ramos, fazendo com suas tintas uma intertextualidade com a escritura do mestre das letras de Alagoas, autor de Vidas Secas.

A obra de Jenner é uma extração poética das possibilidades de beleza que o azul traz. Mesmo aplicando-se a uma fenomenal combinação das cores que a natureza dá, o pintor é um fiel retratista do azul em suas variantes e emite mensagens que nos inclinam a olhar para o alto, a alcançar o céu, a ganhar o mar, especialmente o mar da Bahia, manancial do azul fremente no genial trabalho deste sergipano universal.

O Palacete das Artes prepara-se agora para abrigar a exposição Abraços na Arte: Brasil/Japão, em comemoração aos 100 anos da imigração japonesa, que será de 11 de dezembro até 1º de março, e espera-se um público maior e mais diversificado, para fazer jus às lições artísticas deixadas por nosso Jenner Augusto.

(Publicado no Opinião do A Tarde em 29/11/2008)


segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Clarice Lispector

Eis a minha escola melhor, maior, mais íntima. A forma mais intensa do meu aprendizado - palavras desbragadas minhas naquele jeito sublime de dizer tudo que nos basta. Eis esse mistério reluzente à frente de todo futuro que terei e que sempre me fez respirar, calar e viver o impacto da sua escrita. Eis o meu olhar naqueles olhos de dor e criatividade; a cara da mulher calada, cênica, mítica, mãe e senhora do eterno adeus...
Eis esse desapego dos entendimentos, a máxima dos sentimentos, música dilacerante da existência que fez da vida ARTE.
Palavra que dói, que sangra, mas que salva. Salva da solidão e do tédio. Nos impele a enfrentar nossos inconfessáveis segredos e amplia nossa imaginação melhorando as personagens que escolhemos ser cotidianamente.
Palavra que arde e abre profundas possibilidades... Às vezes irreversíveis.
P.S.: Hoje é uma noite escura, ouço Cida Moreira cantando Chico Buarque, trabalho em um release sobre Rilke, estou em um museu lindo, a cidade ainda é Salvador, o tempo é quente, coisas do verão, minha memória é de Caio Fernando Abreu e Clarice: contos da minha assombração amorosa. Acho que estou vivo... Sinto falta de ar. Estou vivo nesse tédio sem Clarice e olho dentro dos seus olhos na esperança do azul/castanho que me alimenta; pego Felicidade Clandestina e vago no meu desejo de ser escritor e talvez, amado. Hoje é quente e escuro e Salvador e tédio sem brisa sem mar e eu em outra existência. Meu peso é o peso de Clarice. Perdão a todos.

sábado, 22 de novembro de 2008

Eternamente

"Pois tudo que é amor
Parece com você,
Pense, lembre, nunca vou te esquecer"

Meu amor na voz desta mulher:
Só mesmo o tempo
Pode revelar o lado oculto das paixões
O que se foi
E o que não passará
Inesquecíveis sensações
Que sempre vão ficar
Pra nos fazer lembrar
Dos sonhos, beijos
Tantos momentos bons
Só mesmo o tempo
Vai poder provar
A eternidade das canções
A nossa música está no ar
Emocionando os corações
Pois tudo que é amor
Parece com você
Pense, lembre
Nunca vou te esquecer
Vou ter sempre você comigo
Nosso amor eu canto e cantarei
Você é tudo que eu amei na vida
Nunca vou te esquecer .
Tunai / Sérgio Natureza

P.S: Acima, a voz doce dos ventos, Gal Costa, eternizando a memória do amor de mim.

Los angeles, Cidade Proibida


A primeira vez em que assisti a este filme, foi no cinema do Shopping Caboatã, no Imbuí, bairro classe média da Cidade da Bahia; assisti cheio de dúvidas com o pensamento preso a uma história torrente de amor. Da primeira cena, com aquela narrativa jornalística, a trilha jazzística, as imagens leves, fortes, belas, sujas, conduziam-me a uma das películas mais marcantes da minha vida de espectador da "7ª arte": meu pensamento me libertou para aquela novela e para a recepção de sua história tão inteligentemente contada e de nuanças da genilidade de algumas atuações, do indefectível roteiro, da direção impecável, da trilha linda linda linda...O filme. Mesclado de subtextos que desvelavam uma história de amor impossível e indizível e improvável entre dois machos policiais de Los Angeles. Já o vi diversas vezes. Um dia li uma crônica de João Silvério Trevisan sobre esta película e retornei ao filme mais satisfeito ainda. Trevisan sempre pontual, elegante, desconcertante, elucidativo e pedagógico, ampliou muito o meu olhar apaixonado por esse marco do cinema americano espraiado pelo mundo para o bem da nossa imaginação, diversão, transe e lucidez. Imperdível em infinitas exibições. Repita-se.

Márcia Short

Uma linda homenagem a lindeza artística de Márcia Short: bem para nossos ouvidos...


Quando Oyá resolveu entrar num acordo com Xangô, Iemanjá e Oxum, foi para acertar direitinho como seria o aparecimento de alguns seres na Terra, tendo um em especial...Oxalá falou para ter calma com a força, por que os humanos normais não estão lá muito preparados para certas existências entre eles.Oxum, muito faceira e sabedora das artimanhas para adocicar o pai do branco e maior de todos os Orixás, disse ao Grande Senhor que não se preocupasse, pois, aquele ser que viria ao mundo condensaria sua beleza e vigor nos traços da fisionomia e na voz. Os traços seriam admirados por todos e a voz, embora percebida e agradável aos ouvidos mais comuns, apenas tocaria de verdade e com toda sua capacidade de encanto aqueles que se deixassem permear pelo pedaço de astral que aquela voz iria conter.Deste modo, permitindo tal acontecimento na Terra, foi no Brasil, na Bahia, e nos tempos em que vivemos, que a voz desta moça ecoa para todos os que podem ouvir...
Ademais,
Axé, Márcia Short!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Carlos Barros

P.S.: Eu também a sinto assim. Valeu, Carlos.


sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Fly me to the moon

Paula Toller
Uma marca sutil da saudade de um tempo inconcluso: uma doce tristeza que ventila minha memória neste 21 de novembro de 2008, em Salvador, friozinho e chuva e saudadezinha...
Fly me to the moon and let me play among the stars
Let me see what spring is like on Jupiter and Mars
In other words
Hold my hand
In other words
Darling, kiss me
Fill my heart with song and let me sing forever more
You are all I long for, all I worship and adore
In other words
Please be true
In other words,
I love you
Bart Howard

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Consciência Negra 2008

" Olá, Negro! O dia está nascendo!
O dia está nascendo ou será a tua gargalhada que vem vindo?
Olá, Negro!
Olá, Negro!"
Jorge de Lima



Por algum lugar que haja esperença em ser e estar.
Pelos olhos na beleza da criança trazendo, de fato, novas manhãs.
Pela doçura que engendra as ingenuidades e permite o abraço.
Para o que eu trago no ori e é mãe florescente marítima
Energia surgida em Abeokutá, me dá eixo, me faz sonhar.
Para o exercício íntegro da diversidade e para
A livre manifestação da criatividade.
O corpo e a alma sendo.
A mão e o desejo tocando.
A...
O...
A vida que vale a pena pois traz sentido.
O painel de todas cores...
Para a força do meu sorriso
Pairando no pleno sorriso da criança que me estampa...
Por um novo destino
Na criatura que vejo na escritura deste texto.
E que o sangue seja arte.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O melhor lugar é ser feliz

São Paulo
Para Michelle Cirne
Em algum lugar o coração repousa e se lança ao sentido real da existência: muitas horinhas de felicidade. O lugar é o que menos importa - o que vigora e conduz é o mote das sensações inscrito no desejo de estar. O que importa é o cotidiano que nos abriga e nos permite pensar, criar, expressar, mover, mudar, realizar e mais que tudo: AMAR.
São Paulo pontua tudo isso. É o centro das movimentações. Palco para todas as artes e recanto múltiplo para as diversas formas de pensamento. São Paulo é a beleza em seu constante estranhamento e pulula de criação que machuca e deslumbra, que sufoca e liberta, que adoece e cura; é música, confusão e silêncio... Manancial das possibilidades que atraem e expurgam. Às vezes, para quem se lança em sua argonave de busca, São Paulo é solução. Pouso do coração que se agita de amor e criatividade. Coragem assim: uma mulher que se desapega e se encontra.
O mundo é um caminho.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Os olhos na vitória!

Em mim, essa mulher é um amuleto de sorte! E hoje é um dia de sorte...
E eu vejo o mundo com olhos de vitória - vejo o mundo com olhos de águia
Vejo o mundo com os olhos de Bethânia.
Meu olho d'água chora alegria e comunga com a minha melancolia...
Estou na linha do horizonte enxergando muitas possibilidades...
Vôo para além dos lugares num momento de intensa respiração.
Pequenos momentos da conquista de fora realçando as conquistas de dentro.
Meu tempo é agora e eu me encontro comigo tristinho e cheio de felicidade...
Felicidade por poder continuar e fazer algumas coisas do meu real querer.
O olho da cobra verde não me mete medo. Meu segredo é a força d'água.
É da água que me vem meu sustento e minha ventilação.
Meu olho que fita a sorte e a canção que, em mim, se derrama Bethânia.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Lady in Satin


Ouvi-lo é alcançar toda melancolia que há no mundo. Ou talvez, em maior proporção, toda melancolia que há em mim. O curioso é que além de me deixar muito triste, ouvir este CD me deixa cheio de tesão, a libido me domina e eu singro, mentalmente, os corpos que mais desejei na vida. A maior cantora do mundo está ali se despedindo e eu choro todo. O sentimento do mundo é meu e lembro a presença doce de alguém que não passa quando Billie Holiday canta e, neste disco, eu sinto ainda mais fortemente. É porque sou tolo. E só sei amar como tolo. Bebendo o que tiver mas ouvindo só Lady in Satin, maestria da Lady Day.

Por dentro do desespero


Esta é a imagem do cuidado. Panorama da idealização de algo que ficou pra lá. Mas nela, a imagem, está no agora do que vejo. Como este filme me liberta de tudo que não quiseram pra mim, e através dele, sou o meu próprio desejo, minha auto-delação, minha proscrição, meu fascínio. Sou o descuido do meu medo diante de um sorriso que me impregna de alegria, que passa velozmente por mim, agride em doçura a minha memória e fica.
Fica no sensível da minha franqueza e no silêncio da minha alma. Fica eu sendo inteiramente outro. E eu revivo uma espécie de desespero - o amor alongando-se de nada tornando-se eterna morada de todo romantismo. Meu amor palavra na imagem deste filme. Película que alavanca saudades. E dentro do meu desespero com cheiro de café, música e identidades antropológicas. Um filme do amor salvação me condenando ao riso, que quando vejo, sou-me o tormento da vontade banhada de tempo pretérito - eu volto e o reassisto.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Pedacinho de amor e alegria !


13 de novembro de 2008.
Os anos passam numa leveza e numa intensidade do jeito da amizade.
Hoje - amanheceu Billie cantando - o dia foi de saúde, de perfume, cintilar vermelho e branco.
O dia das flores da alma, do riso, do aconchego, do carinho discreto e inteiro, verdadeiro, azul.
Uma manhã primaveril para um encontro que renasce sempre.
Dia de coragem: coisas da intensa maneira de gostar...
Dia da alteridade: a diferença que aproxima...
Dia de águas e sonho: o amor que perdura para além dos tempos cronológicos.
Hoje, 13 de novembro de 2008 - lotado feriado que marca uma grande presença.
A menina da pele, da boca de sorvete, do silêncio educativo, da força, do conteúdo e da forma.
A beleza de sempre, minha linda, Maíra Caffé.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Charme do Mundo



Ela sempre me foi uma boa surpresa: uma cantora linda, uma compositora marcante e uma mulher exemplar. Luz em nossos ouvidos. Inventou, com sua arte, guiar meus sonhos de amor. Tudo nela me veio sempre em nome da beleza, da safadeza, da transgressão. Minha Marina cantando para a vida que eu sempre quis e não tive, mas tenho quando ela canta. Em Charme do Mundo eu me sinto ouvindo Billie Holiday, e me persigo na idéia do afeto que preciso exercer. Marina não sai de mim. Marina febre, lindeza e outras coisas mais:

Eu tenho febre
Eu sei!
Fogo leve que eu peguei
Do mar, ou de amar, não sei
Deve ser da idade...
Acho que o mundo faz charme
E que ele sabe como encantar
Por isso sou levada, e vou
Nessa magia de verdade(Verdade!)...
O fato é que sou
Sua amiga
Ele me intriga demais
Intriga!...
É um mundo tão novo
Que mundo mais louco
Até mais que eu
É febre, amor
E eu quero mais
Huuuuuum!
Tudo o que quero
Sério!
Sério!
É todo esse mistério
Esse mistério!...
Acho que o mundo faz charme
Mas ele sabe como encantar
Por isso sou levada, e vou
Nessa magia de verdade
Verdade!...
O fato é que sou
Sua amiga
Ele me intriga demais...
É um mundo tão novo
Que mundo mais louco
Até mais que eu
É febre, amor
E eu quero mais
Huuuuuum!
Tudo o que quero(Tudo que eu quero!)
Sério!
É todo esse mistério...
Todo esse mistério
Todo esse mistério
Mistério!...

Marina Lima/ Antonio Cícero

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Plata Quemada


"Aqui é o lugar da água, tudo é memória, tudo se molha, tudo se afoga, mas, às vezes , se salva. "
Marlon Marcos
Para que ainda haja tempo de assistir.
E eu ouça, ali, Billie cantando o meu amor sendo sem acontecer.
Uma história de profunda comoção. Um filme para gigantes. No meu caso, dois bem pequeninos.
Avante. A vida é possível!

A voz da intuição


Antes existia somente esperança. E era um movimento único de acreditar por acreditar. Aquela presença da fé; mas tudo muito árido. Tudo transcorria num misto de querer e achar que ia acontecer e se via e se escrevia e se rezava obtusamente, disciplinarmente para algo que não podia e nem no coração funcionava. Ou seja, o coração não garantia e nem referendava aquela quimera revestida de paixão...O tempo passava sem gerar transformação e o amor adoecia. Mas ainda pulsava a tal esperança.
Esperança e expectativa. Nada do envolvimento da sensação. Do saber de difícil decodificação o qual chamamos intuição. Faltava isso : intuição para desvendar a armadilha. Uma história esperançosa e cheia de fantasia - coisas que se muito quer aqui - e ia desaguar na nulidade da vida. Nada se erguia. Nada se projetava. Nada acontecia.
Esperança para alimentar um amor atemporal; amor de perdição. Fagulhas da canção Maurício na voz saudosa de Renato Russo - "voltar a ser feliz"... Amor em esperança mas sem tradução.
Faltava. E o fio da ligação era inquebrável, indestrutível quanto a idéia que se tem de DEUS. O mundo se perguntava sobre as almas que andavam em distração mas não aconteciam. Amor de silêncio numa falta de intuição. Nada da voz benéfica de dentro que nos salva, que nos agride, que nos intimida, que nos amedronta mas , mais que tudo: nos liberta.
Voz de vôo... Imagem de liberdade ...Uma águia voando...Transformação...Força do que tem que acontecer...Amanhecer juntinho...Anoitecer corpóreo... Récitas do silêncio...Olho no olho. O querer querendo...E , tendo. Você.
Esperança na minha falta de intuição.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

É o que me interessa

Lenine ( instantes da realização)
Hoje é duro pensar e dizer assim:
Daqui desse momento
Do meu olhar pra fora
O mundo é só miragem
A sombra do futuro
A sobra do passado
Assombram a paisagem
Quem vai virar o jogo e transformar a perda
Em nossa recompensa
Quando eu olhar pro lado
Eu quero estar cercado só de quem me interessa
Às vezes é um instante
A tarde faz silêncio
O vento sopra a meu favor
Às vezes eu pressinto e é como uma saudade
De um tempo que ainda não passou
Me traz o teu sossego
Atrasa o meu relógio
Acalma a minha pressa
Me dá sua palavra
Sussurre em meu ouvido
Só o que me interessa
A lógica do vento
O caos do pensamento
A paz na solidão
A órbita do tempo
A pausa do retrato
A voz da intuição
A curva do universo
A fórmula do acaso
O alcance da promessa
O salto do desejo
O agora e o infinito
Só o que me interessa.
Lenine/Duda Falcão
P.S.: Eu ainda lhe digo SIM, viu?

Da minha aldeia

Talvez Salvador seja o meu maior sentido de cidade. Mas não só a vejo e sei até onde ela me interessa: uma coisa, agora, de finalização. Esta cidade tem o meu jeito de final e eu a recebo com os olhos em galope pelo horizonte afora. Eu a percebo paisagem e me misturo à minha própria agonia... Não sou do tamanho dela nem do tamanho da minha altura - e ela é a aldeia que me deu a garantia de melhor olhar o mundo. Uma cidade sem sorriso pra mim. Um lugar do meu pertencimento tão hostil em mim. Um vilarejo que me faz escapar da esperança - minha conduta de vida - e que me põe a sonhar com outros cantos aonde o sentido de estrangeiro tivesse sentido. Eu canto para Salvador com a voz e o inteiro de Jussara. Só neles, voz e inteiro de uma cantora mineira que mora no Rio de Janeiro, espelho da beleza crescente e das coisas que fazem sonhar, eu tão a exatidão do que isso aqui me foi como alumbramento e hoje é vontade de deixar.
Mas aqui me é assim:
Da minha aldeia vejo quando da terra se pode ver no Universo....
Por isso a minha aldeia é grande como outra qualquer
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho da minha altura...
Nas cidades a vida é mais pequena
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro.
Na cidade as grandes casas fecham a vista a chave,
Escondem o horizonte, empurram nosso olhar para longe de todo o céu,
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos nos podem dar,
E tornam-nos pobres porque a única riqueza é ver.
Alberto Caeiro
P.S.: Salvador me é o seu Mar.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Bem - vindo, presidente!

Barack Obama
Para desalinhar os vestígios da presença de G.W.Bush no comando dos Estados Unidos e trazer uma grande novidade à história humana no Ocidente: um homem negro, descendente de queniano, torna-se presidente no país do racismo desvelado, à mostra. Não estou falando de economias, de revoluções marxianas ou marxistas, ou bolcheviques, ou napoleônicas, castristas. Falo de Barack Obama, em carne e osso, negro, energético, uma vida que deu certo, que fala em destribuição de renda no âmago do capitalismo, é isso, dentro do capitalismo, sem nenhuma novidade neste sentido. O destaque vai para o que representa para a negrada espalhada no mundo, a ilustração da vida de Obama focado por todas as câmeras da Terra. Expressando sua tolerância a gays, outras minorias étnicas, dado a corrigir, no que for possível, as imbecilidades do seu antecessor, melhor não falar o nome para não dar azar, e cuidar internamente das marcas da pobreza atual do seu povo estadunidense. Bem-vindo, presidente!
Espelhe a sua negritude, retrate a sua jornada de superação, e aqui, no tempo presente, neste instante, respeite as diferenças, e ajude a garantir o direito de qualquer pessoa de amar, de gozar, com a mesma necessidade que temos de comer, beber, respirar... Corrija assim, os erros terríveis da belíssima Revolução Cubana, sob o comando de Fidel, que não entendeu a complexidade humana. Da sua diferença de negro no centro do poder, por favor, faça a diferença, em nome das liberdades afeto-sexuais, porque as demais todos querem ver garantidas. Axé no seu Ori intra-africano. E vaias para a Revista Veja do Brasil.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Bebel Gilberto


Ela já se mostrou em três discos. Uma artista de natureza muito diversificada que nunca nega a herança musical que recebeu em casa - João Gilberto, Miúcha e Chico Buarque - mas que também não se prende a isso e nem deixa de inovar, de se banhar em outras ondas musicais. Uma sofisticação só! Uma voz de brisa em dia de sol, de chuva em dia de frio - delícias que a canção traz... Bebel Gilberto é obrigação na cedêteca de quem ama música popular.

sábado, 1 de novembro de 2008

Impressões da grandeza

Virgínia Rodrigues

Sempre muito atento à cultura brasileira, Caetano Veloso, em 1997, assistindo Bye Bye Pelô, espetáculo do Bando de Teatro Olodum, dirigido por Márcio Meireles, descobriu o canto de nobreza de Virgínia Rodrigues. E daí, o Brasil e o mundo conheceram a expressão artística de uma ex-manicure dotada de reluzente talento que se tornaria uma das nossas melhores cantoras na contemporaneidade.

Ouvir Virgínia cantar é compreender que muitas coisas nascem para dar certo. E vencem os descaminhos que injustiças sociais promovem em nossas vidas. Sem muita escolaridade, ocupando o centro das discriminações que mais vigoram entre nós, ela, negra, mulher, pobre, gorda, é uma cantora sublime, exemplar raro da herança musical legada pelos negros africanos e veículo de belezas intraduzíveis que só a arte saída do grande talento pode expressar.

A sua voz camerística, imprimindo uma tonalidade erudita, ensina com maestria, como se pode cantar o popular de outras formas e sem subestimá-lo. Virgínia é um marco na nossa canção, e vem trilhando uma carreira pautada em trabalhos consistentes, conceituais, maduros; vem confirmando-se como uma das grandes divas da música no Brasil, sem muita visibilidade, sem os estrondos midiáticos dedicados às quase-dançarinas como Claudia Leite, longe de representarem, de verdade, a força das cantoras que em gerações diferentes iluminaram o nosso país: Carmem Miranda, Aracy de Almeida, Dalva de Oliveira, Elizete Cardoso, Maysa, Nora Ney, Alaíde Costa, Elza Soares, Silvinha Telles, Ângela Maria, Nana Caymmi, Clara Nunes, Cássia Eller, Marisa Monte, Jussara Silveira, Adriana Calcanhotto, Ná Ozetti, Rosa Passos, Marina Lima, Rita Lee, Daniela Mercury; citando também as que sintetizam em grandeza todas essas: Maria Bethânia, Gal Costa e Elis Regina, as maiores de todos os tempos.

Alcançar o canto de Virgínia é tomar contato com outras possibilidades musicais nossas, navegando um repertório que começa com releituras da Axé music, passa por Caetano Veloso, por Chico Buarque, apresenta novos talentos como Tiganá Santana, e pousa no centro da musicalidade audível em qualquer lugar no mundo. Assim como Jussara Silveira, Virgínia é outra baiana do mundo. E é matriz de uma singularidade real, sua presença é única e sua voz alimento promotor de elevação no meio popular da humanidade.

Seu novo disco, Recomeço, lançado recentemente pela Biscoito Fino, prima como sempre, pela beleza das interpretações e pela nobreza do repertório, com destaque para Todo Sentimento, de Chico Buarque e Cristóvão Bastos, que a acompanha ao piano, Beatriz, a difícil canção de Edu Lobo e Chico Buarque, Estrada Branca, de Tom Jobim, Alma, de Sueli Costa e Abel Silva, e a imortal de Dolores Duran, A noite de meu bem. Será lançado aqui em Salvador, na Sala Principal do Teatro Castro Alves, dia 13 de novembro, às 21h., em única apresentação. Imperdível.

(Publicado no Opinião do A Tarde em 01 de novembro de 2008)


sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Caio Fernando Abreu

Ele trouxe um olhar masculino para as perguntas literárias iniciadas por Clarice Lispector: um jeito de introspecção numa soltura verbal criando imagens dilacerantes...Impactos ditos de dentro e de fora de uma das mais importantes escrituras desenhadas no urbano de nós, brasileiros. Um gaúcho universal, místico e cheio de fé. Reluzente e feroz. Conhecedor da ambiência dos orixás, adorador de Iemanjá e Oxum, amante da música popular do Brasil, um crítico inteiro das coisas que nos faziam e que nos desfaziam também. Ler Caio F. é chegar pra perto de nós mesmos e umas vezes gritar, outras chorar, algumas calar e muitas imaginar a vida pelo viés da realização. Mais uma epifania, em mim, tal como as marcas que Clarice me deixa, Caio é um dessassosego que me movimenta enquanto eu sujeito de mim mesmo. Um homem de olhares pós-gêneros... Introdutor resoluto dessas coisas de pluralidade, diversidade, identidades múltiplas - um tipo de Caetano Veloso em nossa literatura.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Cachoeira - lugar da paixão!

(Foto Maíra Caffé)
Trago no meu peito, a luz, a força, a beleza, a gente, as águas, a fé desta cidade:lugar da minha paixão. Minha Cachoeira.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Sobre todas as coisas

Para um dia de memória e oração:

Pelo amor de Deus

Não vê que isso é pecado

desprezar quem lhe quer bem

Não vê que Deus até fica zangado vendo alguém

Abandonado pelo amor de Deus

Ao Nosso Senhor

Pergunte se Ele produziu nas trevas o esplendor

Se tudo foi criado - o macho, a fêmea, o bicho, a flor

Criado pra adorar o Criador

E se o Criador

Inventou a criatura por favor

Se do barro fez alguém com tanto amor

Para amar Nosso Senhor

Não, Nosso Senhor

Não há de ter lançado em movimento terra e céu

Estrelas percorrendo o firmamento em carrossel

Pra circular em torno ao Criador

Ou será que o deus

Que criou nosso desejo é tão cruel

Mostra os vales onde jorra o leite e o mel

E esses vales são de Deus

Pelo amor de Deus

Não vê que isso é pecado, desprezar quem lhe quer bem

Não vê que Deus até fica zangado vendo alguém

Abandonado pelo amor de Deus

(Edu Lobo e Chico Buarque)

Virgínia cantando Chico

Mais uma prova da existência dos deuses: Virgínia Rodrigues cantando Todo Sentimento em seu novo CD Recomeço, pela linda e cara Biscoito Fino:

Preciso não dormir
Até se consumar
O tempo da gente
Preciso conduzir
Um tempo de te amar
Te amando devagar e urgentemente
Pretendo descobrir
No último momento
Um tempo que refaz o que desfez
Que recolhe todo sentimento
E bota no corpo uma outra vez
Prometo te querer
Até o amor cair
Doente, doente
Prefiro então partir
A tempo de poder
A gente se desvencilhar da gente
Depois de te perder
Te encontro com certeza
Talvez num tempo da delicadeza
Onde não diremos nada
Nada aconteceu
Apenas seguirei
Como encantado ao lado teu.
(Chico Buarque e Cristovão Bastos)

Chico Buarque


Amanheci com sede de mar, com vontade de escrever sobre o melhor da vida: as coisas mais simples ditas de dentro da poesia, como o canto de Buarque traduzindo acima de tudo: o amor acontecendo. Acordei amarrado em muitas palavras, emaranhado em doces lembranças, mobilizado pela cor dos olhos deste nosso mestre de sempre: ardósia. A ardósia também é de Iemanjá. Iemanjá nos olhos cariocas de Chico e hoje eu tão baiano. Pensando no que a Bahia poderia ter sido pra mim. A voz pequena buarquiana tradutora da sua grandeza imensurável e eu ouvindo Valsinha... Chico sangrando Tatuagem para remarcar minha alma com o nome que me é indelével... Eu seguindo em Todo Sentimento, no centro da natureza desta canção que ensina o passar do amor que fica. Encantado. Eu em mim e em alguém que hoje compõe meu pensamento acompanhado pela música de Chico Buarque de Hollanda. Eu em cheque-mate.
Na linha do absoluto, ouvindo:
Futuros Amantes
Não se afobe, não
Que nada é pra já
O amor não tem pressa
Ele pode esperar em silêncio
Num fundo de armário
Na posta-restante
Milênios, milênios
No ar
E quem sabe, então
O Rio será
Alguma cidade submersa
Os escafandristas virão
Explorar sua casa
Seu quarto, suas coisas
Sua alma, desvãos
Sábios em vão
Tentarão decifrar
O eco de antigas palavras
Fragmentos de cartas, poemas
Mentiras, retratos
Vestígios de estranha civilização
Não se afobe, não
Que nada é pra já
Amores serão sempre amáveis
Futuros amantes, quiçá
Se amarão sem saber
Com o amor que eu um dia
Deixei pra você
(Chico Buarque)
P.S.: Aqui é o lugar da água, tudo é memória, tudo se molha, tudo se afoga, mas, às vezes , se salva.

domingo, 26 de outubro de 2008

O ciúme

Agora, definitivamente, gravado ao vivo, em Omara Portuondo e Maria Bethânia - DVD - Biscoito Fino, 2008. Na voz , dela, minha Maricotinha:

O ciúme
Dorme o sol à flor do Chico, meio-dia
Tudo esbarra embriagado de seu lume
Dorme ponte, Pernambuco, Rio, Bahia
Só vigia um ponto negro: o meu ciúme
O ciúme lançou sua flecha preta
E acertou no meio exato da garganta
Quem nem alegre nem triste nem poeta
Entre Petrolina e Juazeiro canta
Velho Chico vens de Minas
De onde o oculto do mistério se escondeu
Sei que o levas todo em ti, não me ensinas
E eu sou só, eu só, eu só, eu
Juazeiro, nem te lembras dessa tarde
Petrolina, nem chegaste a perceber
Mas, na voz que canta tudo ainda arde
Tudo é perda, tudo quer buscar, cadê
Tanta gente canta, tanta gente cala
Tantas almas esticadas no curtume
Sobre toda estrada, sobre toda sala
Paira, monstruosa, a sombra do ciúme.
Caetano Veloso

Clara e Gal

Para D. Diva Vieira Passos
Essas duas não saíam das eletrolas da minha casa. Era a alegria dos nossos domingos e motivo de congregação. Clara, bela em todos os níveis louvando a cultura religiosa afro-brasileira. Gal, voz mais linda, sossego e esperança. Ambas nos faziam sonhar e dançar. Dançar de verdade e ter coragem para enfrentar outros dias. Bem difíceis, às vezes, bem sem graça...Mas elas, e minha mãe, lá estavam e eu aos sete anos era todo música popular brasileira.
Aprendi que podia muitas coisas ouvindo essa gente- Clara, Gal, Caetano- e tive muita vontade de estudar e fazer e crescer e mais que tudo, tive vontade de ser sendo. Amém, pra todos nós.

DVD - Omara Portuondo e Maria Bethânia


Ali o mundo é pura felicidade. O canto de matriz cubana, negro, inteiro, simples de uma senhora que canta sublimemente: Omara Portuondo. A serena presença da cantora que enche de beleza nossos olhos e de alegria nossos ouvidos. Um dos projetos fonográficos mais expressivos para a cultura no mundo dos últimos anos. Suave resgaste da nossa latinidade reinventada na América, mais por índios e negros. Música é perfume e não sai da memória: Lacho - maganetiza com a dramaticidade de avó de D. Omara, cantando pra Iemanjá Iyá Lodê, também Rainha de Cuba.

Do outro lado, ela, aos 62 anos cantando daquele jeito, longeva, cantora projetista, ativista cultural do Brasil que ela acredita e defende. Um marco da canção popular brasileira, soltando a voz com os ares de diva dos quais ela não abre mão. Reverente a D. Omara, tratando-a com a delicadeza merecida.Linda mulher. Aquela leveza de corpo num canto precioso de sereia nordestina - água e terra e seca e frescor- que abre nossos olhos para nós mesmos sem que evitemos os outros. Ela, D. Maria. A filha de D. Canô, que faz no DVD a interpretação definitiva de "O Ciúme", do mestre Caetano. Nessa canção ela se entrega atriz sem se perder da cantora - sob medida e linda. Que mulher linda é Maria Bethânia.

Duas imperdíveis. O Brasil, Cuba, a América, o mundo, agradecem.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Seu Pensamento

pra o'cê

"A uma hora dessas

por onde estará seu pensamento

Terá os pés na terra

ou vento no cabelo?"

Estará o seu pensamento no sumidouro do espelho em que me vejo ouvindo essa canção? Estará próximo da dor que sinto por sentir e querer me perguntar tudo isso? Estará no cheiro do meu cabelo penteando-se sozinho e eu lembrando de quando você sabia do cheiro dele?Às oito e meia da manhã meu pensamento ouve a canção de Adriana e eu posto a minha saudade...

"A uma hora dessas

por onde andará seu pensamento

Dará voltas na Terra

ou no estacionamento?"

Estará no intervalo entre o que foi e o que deveria ter sido, e como poema vagabundo expressando um sentimento profundo, seu pensamento dá voltas em algum estacionamento e o meu estaciona em você.

"Onde longe Londres Lisboa

ou na minha cama?"

Seguramente - sua imagem entre meu pensamento e a palma da minha mão. Quiloa, Montevidéu, Cachoeira, Rio, Abeokutá... Golfinhos, horizontes, esperança, olhares, vontade em colibris... Aqui, da minha cama.

"A uma hora dessas

por onde vagará seu pensamento

Terá os pés na areia

em pleno apartamento?"

Caminhando, inusitadamente, sobre a fortuna material da minha presença em sua vida - as cartas estúpidas, as linhas, os mapas, as fitas... ? Ou estará na rota exata do esquecimento? Ou terá palavras guardadas para o nada de um futuro exterminado? Onde deslizará seu pensamento voltando-se para a escrita - quais os nomes dos motes, que verde-azulado te inspira? Aonde é seu apartamento nas minhas doze tentativas?

"A uma hora dessas

por onde passará seu pensamento

Por dentro da minha saia

ou pelo firmamento?"

Na correria das estradas dos objetivos... No desenho de equilibrio sem canções internas...Na desértica esfera da mão única da segurança? Na delícia da felicidade?

"Onde longe Leme Luanda

ou na minha cama?"

A distância do seu pensamento se desfaz no romantismo do meu... A paisagem desta cidade, o mar destes instantes, a cor castanha dos seus olhos, a poesia me lendo, releases à toa, nosso silêncio, a cor do som, São Paulo, Fernando Pessoa, Lisboa, Paris, Billie cantando, lembrança do Senhor do Bonfim, uma conta vermelha quebrada, a Legião Urbana, notas em um violão, píncaros da saudade escaldada, uma camisa branca, outra amarela, perfume na janela, a lua rodando, meu coração à entrega, um poema de Hilst na minha parede e tudo pode acontecer enquanto, agora, Calcanhotto lembra cantando: por onde vagará seu pensamento? Longe de mim.