segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

"É o que me sonhei, que eterno dura".

O que sou
O que me inspira

O que me ensina



O que vivo


O que me dói
Dos arredores de mim
para o centro da minha existência:
tudo que li vi ouvi senti sonhei...

Eis-me ali em soluço e gratidão
a ver as melhores cores do dia
a ter a mais intensa das noites.

Eis-me indecifrável mistério
sendo-me ao mesmo tempo
tiete...
O que se desalinha frente às musas
e plagia os poetas;
tão somente aquele inteiro
que também os ensina...
Desse desconforto de ser-me
para o dilacerado prazer de
me ter em sons palavras imagens,
reinventando minha trajetória.

Eis-me o sem glória mas
o de abundante amor
por eles que me deram
mil maneiras de sonhar.




domingo, 30 de janeiro de 2011

Bethânia e as palavras

Marlon Marcos (jornalista e antropólogo)
Especialmente para o Opinião, do jornal A Tarde, em 28/01/2011

Entre os anos de 1983 e 1984, comecinho da minha adolescência, descobri o long play Pássaro da Manhã, lançado originalmente em 1977, por ela, Maria Bethânia. Logo na abertura, a cantora baiana lançava-se a uma récita poética dizendo assim: “Conta a lenda que dormia/ Uma princesa encantada/A quem só despertaria/Um infante que viria/ De além do muro da estrada”. O poema era Eros e Psique, de Fernando Pessoa.

O Pessoa que eu já conhecia por conta de Os argonautas, de Caetano Veloso, e passara a adorar através da dramática interpretação de Bethânia em seu Pássaro da Manhã, disco recheado com outros textos de grandes literatos como Clarice Lispector, voltado à união exitosa entre textos literários e teatrais e as belas canções da excelente música produzida no Brasil nos anos 40, 50, 60 e 70.

Eu, menino nascido no Centro histórico de Salvador, estudante do Colégio Estadual Azevedo Fernandes, no Pelourinho, ouvia música e aprendia poesia com uma cantora popular, nascida na pequena Santo Amaro da Purificação, que já se tinha tornado uma das mais importantes no cancioneiro brasileiro naquele início dos anos 80.

E toda vez que revisito minha memória para saber do meu acesso à literatura brasileira, antes, recaio nas canções de Dorival Caymmi, Caetano Veloso, Gilberto Gil, e relembro minhas incursões amadianas estimuladas pelas vozes de Gal Costa e Maria Bethânia. Esta última, a grande responsável pelo meu desejo de viver dizendo poesia e aquela que, da indústria fonográfica, mais popularizou Fernando Pessoa e Clarice Lispector entre os brasileiros.

E é sob o signo da poesia e da literatura que Maria Bethânia viaja em seu novo espetáculo Bethânia e as Palavras, lançado em setembro de 2010, no Rio de Janeiro, e que pousa hoje no Teatro Vila Velha, numa sessão para convidados mais que especiais: estudantes e professores da Rede Pública do estado da Bahia.

Com duração de uma hora, a cantora desfia nomes como Manuel Bandeira, Fausto Fawcett, Guimarães Rosa, Sophia de Mello Breyner, Wally Salomão, entre outros. O recital é intercalado com canções, num espetáculo que objetiva fazer da poesia um instrumento vigoroso para a educação e para o deleite da alma de nossos educandos e educadores.

Um dos aspectos mais importantes do Bethânia e as Palavras é a sua inclinação para pulverizar excertos poéticos entre crianças e adolescentes e a partir daí, tematizar o uso da palavra numa perspectiva criativa; ao fomentar o gosto pela leitura através da poesia, a cantora se lança em rememorações que valorizam a antiga educação pública, praticada na Bahia nos anos 40 e 50, da qual, ela mesma, seu irmão Caetano Veloso e o artista plástico Emanoel Araújo, tiveram acesso vivendo em Santo Amaro da Purificação.

Ao ver Bethânia em récitas de textos dos gigantes da língua portuguesa, preocupada com discentes e docentes, fico a me perguntar se em seu segundo mandato, o governador Jaques Wagner vai parar de maltratar tão fortemente os professores da Rede Pública e investir numa revitalização da nossa Educação Oficial? Se vai priorizar, de verdade, a educação? Se o PT coaduna-se com idéia da cantora de espraiar a arte da palavra para que a gente aprenda a ler o mundo com mais sensibilidade e saiba, em conjunto, cobrar de quem nos governa seja lá quem for?

Nessa nova empreitada artística, Bethânia é acompanhada de violão e percussão, sonorizando os belíssimos fragmentos de textos selecionados por ela, com a ajuda do antropólogo Hermano Vianna e do diretor teatral Elias Andreato.

Em cena, a voz sob medida edita nossa negritude e confirma os tons civilizatórios da cultura negra em todo Ocidente: recita o transcendente poema Tambor, do moçambicano José Craveirinha, sendo o ápice de beleza do espetáculo, e o momento educativo mais emblemático para a valorização do negro que compõe a alma e o sangue da maioria do povo brasileiro.

Uma festa literária para nossos ouvidos, promovida pela artista que já deveria ter sido laureada com o título de Doutor Honoris Causa, pelas universidades existentes na Bahia, já que seu trabalho artístico é um diálogo profundo com a cultura no Brasil.

Qualquer coisa



"Esse papo já tá qualquer coisa
Você já tá pra lá de Marraqueche"


Ainda amanhece aqui e estamos sob efeito da agonia. Em algum lugar um pouco de alívio. O resto da esperança que alimentamos por nada voou para lá e nos deixou assim: qualquer coisa... A boca dizendo poesia diante da vida findando. A possibilidade do acerto foi perdida e eu não sei a onde ir.

Mexe
Qualquer coisa dentro, doida
Já qualquer coisa doida
Dentro mexe
Não se avexe não
Baião de dois
Deixe de manha, 'xe de manha, pois
Sem essa aranha! Sem essa aranha!
Sem essa, aranha!
Nem a sanha arranha o carro
Nem o sarro aranha a Espanha
Meça: Tamanha!
Meça: Tamanha!


Meu lugar era um barquinho. Meu mimo girando por dentro da voz de um homem que é o maior mestre; minha sede andando a cavalo quando o mais eu caminha sobre águas. A música desatinando a falta da grande poesia e o silêncio cantando: qualquer coisa.


"Esse papo seu já tá de manhã.
Berro pelo aterro
Pelo desterro
Berro por seu berro
Pelo seu erro
Quero que você ganhe
Que você me apanhe.
Sou o seu bezerro
Gritando mamãe.
Esse papo meu tá qualquer
coisa
E você tá pra lá de Teerã"


Hoje era ela que também não foi. A alma em despedidas. O peito, cheio de escritos, fora entupido por ela falando. O amor, em mim, sempre em discórdia... O colo da mãe; orientação escolar; achego de vinho e cerveja; ela falando; o toque negro do tambor; ela cantando; a eletrola a expulsando de mim para em mim ser vazio sem dor; meu eu bezerro; meu medo; minha escrita chorando; ela falando;. ela modelo; ela cantando; ela degredo. Nada a pode alcançar. Uma dança suave na paisagem do sorriso vitorioso. A música do mestre... E eu, deverasmente, imerso na melodia de Qualquer coisa.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Amor imorredouro

Olhava-me como se me dissesse: olhar é viver. E eu nunca desistia. Queria como a força do sol para se fazer no dia e deslizava-me feito água para lavar aqueles olhos. Era um encontro amoroso pautado em literatura, poesia ia, prosa vinha, e a gente era feliz em nossos desenhos de emoção. Falávamos de tudo, menos política, e tínhamos o sonho sagrado dos músicos: éramos sons poéticos. Fruir livros era tão grande quanto fruir corpos. E fruir a vida, dali dos nossos instantes, nos fazia conhecer, de dentro, a profunda alegria por estarmos vivos, amigos-amantes, juntos.
Foi a duração de uma epifania. Trajetos literários reinaugurando a melhor das civilizações: a do amor. Amor imorredouro.
Seus olhos nunca escaparam da memória saudosa da minha pele.

Maria Bethânia: a maior cantora do mundo atual


Ontem, mais uma vez, vaticinou-se em mim... Não tem jeito, esta mulher é o melhor artista da canção neste País, a grandeza como cantora combina com a genial inteligência, sua beleza inexplicável , a força do dizer, a coerência artística e existencial, faz dela essa que mergulha a gente em profunda emoção.
O Teatro Vila Velha reviveu uma história que me desbunda. A história da cantora Maria Bethânia, a maior cantora viva ( graças a Oyá !) do mundo... Ela inteira poesia, falando como doutora em educação, ajudando a sensibilizar o atual governador da Bahia a olhar para discentes e docentes com a devida atenção neste nosso Estado.
Deverei conservar o mito no baú da minha alma, fruir a cantora e seus produtos criacionais, mas, a partir de hoje, paro de escrever sobre ela... Ela que já se escreve dos discos videos palcos como controle de qualidade no Brasil e deve ser exaltada sim, para que a gente não se envergonhe de ser brasileiro. Obrigado, Bethânia, por me ensinar a ler!!!

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Sem lugar


Ando vendo postais. Entre ser e ter vontade de seguir alguém. Pousando nisto de viver sentido alguma vez. Ficando parado em silêncio para o caminhar do tempo que não me tira do lugar. Eu, o sem movimento. O que só vê postais e nada nas águas do mundo alheio. Aquele que se serve como alimento de si mesmo mas orbita em torno do outro. A desfunção do querer que existe sem prazer. Calor calor calor.
Ando mergulhado em postais e nenhuma cidade me cabe neste mundo. Talvez eu me seja só saudade e canse e não sirva como escrita, não sirva como nada.
O sorriso de Cachoeira é perverso.
O Rio é linda inconclusão.
São Paulo me realiza no susto.
Paris se distancia.
Nova Iorque me fascina e é medo.
Abeokutá eu renasço.
Sevilha é degredo.
Lisboa me evita e faz poesia.
Barcelona é um filme.
Luanda é encanto político.
Lagos não me moraria.
Salvador me desanima mas é o que me finca no mundo.

Tudo se esvazia nesse tempero de dor e confusão.

Maria Bethânia - Programa " Almanaque " 2010 (na integra!)



A entrevista é belíssima.
E ela, hoje, traz sua poesia na voz para seu público no Teatro Vila Velha, em Salvador da Bahia. Uma hora para aquele caríssimo aprendizado, onde tudo na gente ouve vê sente... Maria Bethânia das canções e das palavras.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Carlos Barros: sol do Sul


A voz pode ser um portal para a alegria e ainda melhor: fazer a alma ouvinte sondar. A música é parceria entre mãe e filho, trajeto do espírito querendo fazer e acontecer e, mais que tudo, querendo encontar. A música desliza pela voz de Daniela Mercury e aporta na voz de Carlos Barros num desaguar exato de dois que acenam para a criação e se querem solares...
O canto reverente de Barros espelha com altivez uma de suas inspirações: La Mercury. Mas quem o ouve em Sol do Sul, reaprende esteticamente esta canção, e viaja para um lugar qualquer onde o que se sente é melhor que alegria.
Sol do Sul é expoente na vibração artística da nossa Daniela Mercury. E Carlos Barros que melhor a compreende, reinventa com a interpretação, uma das melhores canções de sua maestra, aquela única Rainha do Axé, melhor atração do cansativo Carnaval de trio e cordas da Bahia.
Por isso que o canto de Barros é urgência em nossa cidade. Para reacender possibilidades tangíveis, lúdicas, intelectuais e redimensionar no nosso mundinho o que já era beleza e ninguém via ou fingia não ver...
Por isso que a doçura da daquela voz meio masculina fere os matemáticos propósitos de quem faz música como ciência positiva.
Por isso que aquilo que suja viabiliza a arte de cantar popular...
Barros tematiza a vida no que há, o humano respirando transpirando gozando de sexo chorando; criando brisas morenas para a orla cotidiana da poesia de quem ama a música.
Sol do Sul é um levante, uma sublevação do simples que quer, que sabe, que pode, que vai... Que já diz.
Diz a voz do intérprete que melhor amadurece nessas raias difíceis das conspirações lítero-musicais na Bahia. O homem cantando.
Carlos Barros, ou simplesmente, sol do Sul para o Planeta. E não é só alegria.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Flores e Saudade


Era bom quando me ofertava em flores aos seus olhos.
Me fazia canção e menino
e dançava contigo sem lhe tocar.
Você, insuportavelmente, sorria
sem saber o que fazer
e me retribuía com a poesia
do seu silêncio...
Leve, meio Pã meio Fred Astaire...
Meus olhos coloriam sua partida
e o coração inquebrantável em esperança
esperava o retorno das suas asas
sobrevoando o estar da minha sala
que se queria ser nosso quarto.

José Alencar: bravo!


Esmagadora vontade de viver
Que esmaga a própria morte.
Para além das lógicas econômicas,
Este senhor comove
E se nos acende
Neste exemplo de querer
Estar aqui!