Salvador anda desértica, pálida, ensimesmada na mesmice.
Arrochada demais, criativa de menos. Mas, às vezes, circula, sonoramente, a
esperança por nossos ares. Numa noite, 11 de setembro de 2012, no histórico
Teatro Vila Velha, às 20h., a voz de uma mulher, inclinada a celebrar a
trajetória artística de uma das maiores cantoras do mundo, surgiu como
ensinamento para afirmar que ainda podemos ser.
Aconteceu no show Solar. Claudia Cunha, a excelente cantora
paraense existindo entre nós, revisitou o repertório de quase 50 anos de Gal
Costa, e mostrou à plateia, que superlotou o Vila, a presença de qualidade na
música produzida na Bahia atualmente. Foram récitas de canções como Flor do
maracujá, Me recuso, Eternamente, Barato total, da safra diversa e modernizante
de Gal, cantadas sem saudosismo, sem parcas imitações, sem exageros. O
repertório foi brilhantemente executado numa espécie de homenagem que só uma
grande artista pode fazer.
Ali, ao se ouvir Claudia Cunha, artista sem o destaque e o
reconhecimento merecidos, a sensação foi de intrigação e deleite; a voz que
tempera canções, numa afinação de transbordo governando nossa respiração e nos
alimentando de ideias.
Foi inexprimível sentir aquele canto, assistir à cantora
acompanhada pela excelente banda, numa interpretação arrebatadora da canção
Negro amor, versão de Caetano Veloso, que é um dos emblemas potencializadores
da voz sublime da Gal Costa, e Claudia a cantou como síntese do seu próprio
talento, ali, à disposição da história da eterna Gal.
Claudia Cunha é um ser advindo do mistério das sereias, entre
mar e igarapés; seu canto é fonte de luz e nos convida a cuidar de nossa
cidade, do nosso convívio, da música que possamos para além dos dias de
Carnaval. Uma menina mestra, senhorinha das canções, que tem que assistir a
outras claudias dando “lições de canto”, em programas dominicais, só para
estender a banalidade que toma conta do mercado musical neste país.
Ouvi-la daqui, frente às águas da nossa baía, geradoras de
Dorival Caymmi e Tiganá Santana, é saber que nós podemos muito.
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