Guilherme Leme ( O estrangeiro de Camus)
"Vou ver quem devora quem "- Clarice Lispector
Eu.
Começo a desenhar a pertença que não tenho. Me seguro na imprecisão de um horizonte que não vejo. Caminho por debaixo de pontes. E sigo. Sozinho. Eu. Navio singrando mares castanhos dos olhos que me refletem. Nada está perto. Ao longe, mais que deserto, escrevo meu amor no dorso dele que não me pertence. Escrevo rascunhos por cima da obra final dele, tão somente, só assim aprendo esperar.
Eu.
Enfeito-me daquela poesia e respiro esperança. Me lanço em calmarias. Negocio com o tédio, pois no que vejo tem a tal poesia... Seguro-me na mão do mistério para entender esta duração. Sem roupas e sem certezas caminho a falta de pertença que traduz minha solidão. E beijo o dorso dele. E me faço carinho. E com ternura invado um mundo que não sei habitar. Invado com a delicadeza deste amor. Vazio - escapo para o virtual do que sinto e nisso, há a presença dele. E nisso, minha falta de pertença é maior.
Eu.
O estrangeiro. O sem lugar. O que se recolhe ao som do carinho. O que escreve como terapia. O para além. Aquele que nada nos olhos do anjo. Que cura suas asas. Que o traz para dentro. Que o transforma em menino e deus. O que desmorona na configuração do adeus. O que segue seus versos estrelares. Eu, em sofreguidão resgatado pelo vento. O esmagado pelo tempo. O poeta sem solução.
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