segunda-feira, 6 de maio de 2013

Mar de Clarice


Tão suave que eu desapareço, entre naves e afogamento, disforme, engolido pela terra, sozinho no quarto vão do apartamento, à espera deveras, ouvindo canções, secando livros, sem lágrimas, mudo ao interno, largado ao externo de um desejo sem futuro.

Visualizo a coragem. Meus dentes mordem a maça, se vivo em pecado não sei do seu sabor. Horrível ter esperança em pleno afogamento. Eu que frequento mar, rios, lamaçais, bueiros, esgotos, chuvas, gotejos, pingueiras, cuspos. Eu – descendo essa escada que me leva à esquina de um lugar sem precisão. Eu – que preciso tanto de abraços que me sequem, que me sirvam sentido, que tolerem a minha emoção.

Eu que vasculho a embalagem dos presentes alheios, e deixei meu coração nos Ciprestes a alguém que o entregou aos leões. Que recito o que leio como se fosse meu, que recrio minha vida modulada no espelho, temendo o tempo, chorando ao ventilador, sentindo frio acima da cidade, correndo todos os riscos, mas vendo a coragem. Eu me sinto, mas não me entendo.

Sigo. Entre gritos e silêncio.  Ressoando em arestas que são as asas negras do anjo na canção que sabotei o nome. Pegado à parede da confusão, cínico como as teorias que me querem explicar o desejo; vazio de gente, mas adorando gente numa espécie de aquário que criei para representar a minha admiração.

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