Partículas do fascínio

Jussara Silveira

Agora é madrugada e eu, num passeio sem pouso nem casa, busco traduzir a suavidade no silêncio que faz nesta parte da cidade do Rio de Janeiro. A suavidade tem nome de jussara, é mulher e cantora, e se conduz pelos caminhos mais serenos da arte permanecendo linda e humana e alcançando a alma e os braços dos seus ouvintes.

É madrugada e a voz jussara faz brisa e um tipo de sol para trazer companhia... Faz mar naquele canto com jeito de Bahia e formam- se lagoas e cachoeiras para emoldurar a imaginação notívaga: ela, a cantora, respira a poucos quilômetros de mim, toca baixinho e nem sabe que meu mata-saudade, meu busca-sentido, meu afoga-solidão, meu rememorar sutil, conduz-se nas notas claras e doces do seu canto de Sereia.

Sento na pedra do mar e silencio numa audição para além daqui: me lanço a imagens que se encontram em Salvador, recomeço esquecimentos para abrandar o desejo, secar a vontade e só ouvir a senhorita Silveira - dona da beleza mítica do caçador envolvida na realeza materna da senhora dos mares...

Sou-me duas horas e meia da manhã no Rio e minha melhor paisagem é o rosto da cantora estampado num encarte de CD e sua música dorzinha e felicidade me fazendo vencer podridões trabalhistas contra mim, apego a endereços fixos, saudades e minha prática contínua de confusões amorosas por onde me lanço sem respostas a me aquecer contra ao próprio frio que eternizo em mim.

Sou-me no cheiro nos gestos na calma no alinhamento na sensualidade na clareza e mais e mais e mais e mais, sou -me na musicalidade inteira desta diva que melhora e se humaniza para a recepção de gente que, como eu, não se sabe viver sem música popular brasileira.