quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Mãe Zulmira celebra Nanã




Muitos encantos erguidos pelos negros de Salvador perduram na expressão religiosa de muitos terreiros de candomblé que iluminam esta cidade e preservam amálgamas  culturais que a história nos deu. Todos os anos, o Terreiro Tumbenci, fundado em 1937, e comandado hoje por Mãe Zulmira, no dia 26 de julho, dia católico de Santana, a mãe de Maria, que é sincretizada com a Senhora dos lamaçais, a grande avó do candomblé, Nanã, leva presentes consagrados a este orixá que comanda a vida e a morte, sendo a consorte maior dos mistérios da fé que orientam aquele terreiro.

No findar da tarde, ao som suave dos atabaques, e de cânticos que exaltam Nanã, flores, perfumes, joias, bilhetes, enfeites, iguarias alimentícias e amor singram e mergulham nas águas sagradas do Dique do Tororó. Uma tradição que já dura décadas e que derrama beleza, sutileza e esperança sobre todos os que acompanham este ritual de fé.

Mãe Zulmira se traduz nos arquétipos de Nanã e representa para o povo de santo de nação congo-angola, jeje e ketu um símbolo vivo de resistência e força em nome das religiões de matrizes africanas na cidade da Bahia. Aos 78 anos de idade, 61 anos como sacerdotisa, ela ensina o cuidado e a perseverança que se deve ter na prática do candomblé, encontrando-se, em seu exemplo, com outros baluartes religiosos baianos como D. Timóteo Anastácio, o saudoso abade do São Bento, ou o importante Agenor Miranda, saudoso babalaô e signo da sabedoria do Ifá entre nós.

Nessa tarde, no Dique do Tororó, a Bahia fundada sob a égide das civilizações negras que se misturaram aos portugueses e tupinambás, matriz sociantropológica  da ideia de Brasil, revive-se na plenitude da sua vocação popular e entrecruza sentidos religiosos que espelham a Iyá Zulmira reverenciando sua mãe Nanã. O objetivo é atingi-la na lama que habita o fundo do Dique, tocá-la com os elementos sacerdotais que configuram o seu culto, e se permitir, em mentalizações da fé, ao bem estar e à prosperidade que o povo baiano tanto precisa quando a política só tem trazido desgoverno e atraso. Saluba, grande Zumbá!

Marlon Marcos é jornalista e antropólogo email: ogunte21@yahoo.com.br
(Publicado no Opinião, p.03, Jornal A Tarde, dia 26/07/2012)

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