quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Marcas da deseducação

Adalgisa Colombo ( já que nada é perfeito)
No dia 13 de abril de 2008, às 22 h., a TV Bandeirantes transmitiu o Concurso Miss Brasil 2008, entendido como um novo momento de exibição da beleza da mulher brasileira, sem perder o glamour dos tempos de outrora, nos quais a classe média em nosso País parava para prestigiar pela televisão este evento.

O Brasil deve ter mudado muito de lá pra cá. Mas, naquela noite, o que mais me chamou a atenção foi o tipo de beleza representacional da “mulher brasileira”, quase em sua totalidade branca, repetindo, reiterando o protótipo de um Brasil que só um rosto étnico se marca como bonito e atraente, e as falas que ratificavam este perfil são de entristecer qualquer cidadão que já tenha ouvido falar em leis que procuram contar de modo mais real e eficiente a história da formação do povo brasileiro, marcado pelas presenças do índio e do negro. Risíveis foram as deixas dos apresentadores em torno do ideal de mulher bonita, de como as “misses” deveriam demonstrar suas preocupações intelectuais e sociais, validando estereótipos e deseducando os telespectadores que se arriscaram a assistir o Concurso.
O que foi ali mostrado não é pra ser criticado à luz de teorias da etnicidade e nem do feminismo, simplesmente é pra ser entendido pelo bom senso de qualquer individuo que participa disso que se chama cultura brasileira. Uma cultura multirracial, que em algumas regiões tem a predominância de etnias negras e indígenas e suas representantes quase sempre são brancas, ou, muito embranquecidas para acompanharem o padrão nórdico do ideal de beleza que ainda nos comanda.
É ao se deparar com essas realidades, que percebemos a urgência do trabalho de grupos político-culturais, como Ilê Ayiê da Bahia, e outros espalhados pelo Brasil, buscando afirmar outras formas de se entender o belo na expressão humana e valorizar a nossa diversidade fenotípica como fruto da riqueza que traduzimos em nosso cotidiano.
Chamar o Concurso de racista, talvez seja mergulhar no desgaste que esta palavra promove no sentido político que ela evoca. Pode parecer um ajuste panfletário se falar de racismo, pois então, falemos em deseducação e de invalidação do sentido da nossa convivência social e do exercício pleno da cidadania daqueles que não esboçam uma idéia (já desbotada), mas recorrente, da padronização estética que só legitima a herança européia deixada entre nós.
O momento mais ultrajante do Miss Brasil 2008, ficou por conta da fala da ex-miss Brasil 1958, homenageada da noite, a carioca Adalgisa Colombo, que ao ser questionada sobre a derrota da mineira Natália Guimarães no Miss Universo de 2007, sentenciou: “perdeu para uma mulher oriental. Oriental e feia ainda por cima”. Depois a lúcida senhora, disse que esse tipo de concurso sobrevive porque é do bem.
E nós continuamos a precisar muito de beleza e de educação. É duro ver escolas públicas tradicionais fechando as portas no Centro de Salvador, professores sendo vilipendiados no turbilhão do descaso... As perspectivas nos empurrando para a torpe constatação de que o Miss Brasil é nada mais, nada menos que o reflexo do ainda povo desinformado e deseducado que somos.
(Publicado no Opinião do A Tarde em abril de 2008).

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