quarta-feira, 1 de julho de 2009

Caramelo e o universo feminino

Por Vitor Carmezim

"Rimbaud

E

de repente percebi
que par délicatesse j’ai perdu ma vie”

Neide Archanjo, em Todas as Horas e Antes


Uma mulher que namora um homem casado e anseia que ele desfaça o casamento. Uma muçulmana que vai se casar, mas não sabe como dizer ao futuro marido que não é mais virgem. Uma atriz que não aceita a velhice. Uma mulher que sente atração por mulheres. Uma senhora que abre mão da vida em função da irmã mais velha.
Em Caramelo (Sukkar Banat, 2007, Líbano/França), os substantivos femininos reinam. E também flutuam, imperiosos, os sentimentos que povoam o universo feminino sob a forma do desejo, da abdicação, do receio, da superação, da submissão, da crença no amor. Da beleza. Do cuidado.
A história se passa, boa parte, dentro do Sibelle, salão de beleza do qual são donas três das personagens citadas acima. Ali, entre bobs, escovas, pinças, alicates, os dilemas são postos, sem maquiagem. Ali, fluem as conversas e as opiniões de umas com as outras, e o espectador passa a mergulhar nos meandros da alma feminina, tão rica, misteriosa e bela.
Rima mostra que gosta das mulheres com o olhar. Nada diz o filme todo sobre isso. Cala, num “silêncio que não é mudez”, como escrevera Ana Cristina Cesar.
Layale – vivida pela atriz Nadine Labaki, que também dirige o filme – vive às voltas com sussurros ao celular e buzinas do carro do homem misterioso cm quem se relaciona: um homem casado. É a história da entrega, das amarras de um amor em suspensão todo o tempo.
É pelas mãos de Layale que o caramelo do título aparece na sua forma mais visceral: a mulher do seu namorado vai ao salão para se depilar. E será tratada por Layale, que antes de aplicar o produto, se delicia, às escondidas, com o sabor do caramelo utilizado como cera – o sabor da vingança, da vitória enviesada, do doce se sobrepondo ao amargo de viver na sombra.
As outras histórias do filme têm também suas riquezas e pequenas pérolas imperdíveis. Pedras brilhantes engendradas no modo feminino de encarar o mundo, viver as relações humanas: todas elas emolduradas sob a égide do amor.
É impossível escapar do impacto doce de Caramelo.
Retirado do blog Inéditos e Dispersos (http://carmezim.wordpress.com/)

Um comentário:

Carmezim disse...

Obrigado pela reprodução e, sempre, pelo incentivo!

Abraço!