Ela tinha que ter lançado um disco assim na rota do outono; num período de chuvas descontroladas; num momento das tórridas lembranças, da vontade de hibernar, aconchegar-se e daquelas crueis perguntas: eu existo pra quê?
No dia em que ouvi o disco, na primeira audição, sequei um litro de vinho do porto e pior, sozinho...Chorei bêbado até de manhã.Não tive ressaca e ela naquele canto não saiu de mim; sofri mais do que já sofro; senti o mundo sobre mim e como posso eu gostar tanto de Nana Caymmi?
O CD celebra memória e amores doídos. Marcado daquela respiração que divide música e interpreta na gente que a ouve a dor dilacerante de existir e de gostar. Um disco feito para lembrar do melhor e do pior que a paixão dá ou deu e seguir adorando a estupenda cantora que nos empurra ao abismo desta decisão: lembrar do que se deve esquecer.
Mas a gente quer e Nana permite e alimenta nosso masoquismo e eu bebo e ouço e choro e canto e vivo e me masturbo pensando com o corpo no que seria a festa de um retorno. Bebo e depois de tudo, bem bêbado, leio os poemas de Hilst dedicando -os ao nada que acelera minha memória.
Sem poupar coração em mim desabando água de chuva pesada: frio, muito frio. E a beleza intensa que a desesperança da cantora perfaz - sua voz de arrasamento: fuzila oprime escraviza aponta lembra marca sangra sonha lacrimeja balança pertuba e isso tudo é a poesia do desespero e basta.
Sem poupar coração saiu pela Som Livre, nada muito novo, mas tudo necessário para se aprender que o talento de Nana de Caymmi não exige mudanças, ela canta e a gente sofre e a beleza se instaura acima dos vestígios que restaram do que fomos antes da audição.
Um comentário:
Nana, uma das maiores, melhores!!!!
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