quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Caetano Veloso e novas assertivas sobre o 13 de maio

Durante a festa dos 120 anos do Bembé do Mercado, a historiadora Ana Rita Machado faz sua exposição em seminário de que participaram Rodrigo Velloso, Mabel Velloso, Zulu Araújo, o prefeito Ricardo Machado e Caetano, entre outros. Foto: Toinho Simões | Agência A Tarde 13.5.2009

Marlon Marcos

especialmente para o blog Jeito Baiano, de Jary Cardoso



Em 7 de agosto de 1942, na cidade de Santo Amaro da Purificação, polo de efervescência cultural do Recôncavo Baiano, nasceu Caetano Emanuel Vianna Telles Velloso, internacionalmente conhecido como Caetano Veloso, um dos mais representativos artistas do cancioneiro brasileiro. Divisor de águas no cenário cultural deste país, além de cantor (hoje o melhor do Brasil) e compositor, Caetano se destaca entre nós como um formulador de idéias provocativas e instigantes. Cria canções com a mesma habilidade que desfia leituras polêmicas sobre o “ser Brasil”, fazendo incursões em áreas especializadas do saber acadêmico e, às vezes, enfurecendo historiadores, antropólogos, sociólogos, linguistas, literatos e seus eternos “amores”, os jornalistas.



Foi no mês de maio do corrente ano, no dia em que se comemora a Abolição da escravatura, em Santo Amaro, que Caê tornou a irritar seus espectadores, desta vez, afirmando: “o 13 de maio é da Princesa Isabel e é burrice se negar a importância histórica da abolição”. Essa deixa inflamada ocorreu numa noite de reflexões sobre os 120 anos do Bembé do Mercado, festa religiosa do candomblé santo-amarense em comemoração ao fim da escravidão, que sempre tem sua culminância, no dia 13 , com a oferta de um grande presente à Senhora das águas salgadas, o orixá Iemanjá. O evento-seminário foi organizado pela Secretaria de Cultura daquele município, que tem como secretário Rodrigo Velloso, um dos irmãos do cantor, e contou com a participação de Zulu Araújo, presidente da Fundação Palmares, com a historiadora Profª. Ana Rita Araújo Machado, entre outros discursadores.



As falas de Ana Rita Machado e de Zulu Araújo foram na direção de se recuperar a memória popular, negra e religiosa do Bembé do Mercado e assim, minimizar a mitificação em torno do nome da Princesa Isabel, vista pelas historiografias oficiais como a redentora dos negros no Brasil, e negar o projeto abolicionista efetivado com a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, sem garantir cidadania e inclusão social aos negros tornados livres.



A partir destas falas, consideradas eloquentes e inteligentes por Caetano, que o nosso autor de Trilhos Urbanos despejou sua verborréia e criticou os movimentos negros brasileiros, apontando-os como meras cópias da negritude “norte-americana”, falou em atraso, em um aprisionamento ideológico datado nos anos 70 e que para se prosperar é preciso se fazer uma leitura mais ampla da Abolição, um fenômeno histórico considerado pelo cantor, como instrumento vital de emancipação sociopolítica dos humanos negros no Brasil, e que se deve falar em 13 de maio como conquista sem negar a importância da princesa Isabel neste processo.



Em entrevista coletiva para divulgar em Salvador seu trabalho mais recente, Zii Zie, um dia após as polêmicas desferidas em sua cidade natal, o compositor afirmou que os impedimentos de avanços e inclusão dos negros neste Brasil se devem muito mais a limitações da República do que um possível descaso legal por parte da Monarquia naquele período: “Se os negros não avançaram a culpa foi da República”.



Na órbita das revisões históricas em torno da Abolição, quem se filia a muitas impressões de Caetano Veloso é o seu conterrâneo, o poeta Jorge Portugal. Portugal acha que ao superestimar o papel de Isabel no 13 de maio, Caetano se lança numa provocação, mas não deixa de apontar reflexões muito relevantes para que tenhamos uma compreensão mais nítida da importância desta data na história brasileira.


Jorge Portugal comenta também outras reflexões que são emblemáticas e estão em sintonia com Veloso, as de Cristovam Buarque que afirmou: “O dia 14 de maio já foi melhor que o dia 12”; e do lustre militante do movimento negro Samuel Vida, advogado e professor universitário, que também defende uma releitura do 13 de maio para destacar os avanços que esse evento ocasionou aos nossos ancestrais de origem africana.



Hoje, Caetano faz 67 anos de vida, mais de quarenta de carreira, e com certeza, quase todos de polêmica e muita vanguarda, haja vista, reza a lenda, que foi ele quem escolheu o nome Maria Bethânia para sua irmã recém-nascida, quando ele tinha 4 anos; criou polêmica em casa, e ganhando na sugestão, acertou em cheio ao ajudar na afirmação de um nome artístico, o de sua irmã, como uma das marcas mais importantes do canto feminino no mundo contemporâneo.


(Publicado no Jeito Baiano ( http://jeitobaiano.wordpress.com/), em 07 de agosto de 2009, aniversário de 67 anos de Caetano Veloso).

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