domingo, 31 de janeiro de 2010

Dolores Duran, escritos ao coração

Dolores Duran
Ouvi-la é se acender por dentro. Ficar a viajar pelos trajetos memorialistas do coração. Dói pra caramba! Ela morreu em 1959 ( mesmo ano em que Billie Holiday também morreu), com apenas 29 anos e, ainda assim, é um nome sagrado na composição brasileira: grande compositora e cantora, a moça levava para o palco a sensação desesperadora de se querer um amor e falava, ou melhor, cantava os estragos que a solidão ocasiona numa alma sensível. Rainha da fossa, sim. Nítida vontade de cantar o amor perdido ou se perdendo, um pouco assim:
Eu desconfio que o nosso caso está na hora de acabar
Há um adeus em cada gesto, em cada olhar
Mas nós não temos nem coragem de falar
Nós já tivemos a nossa fase de carinho apaixonado
De fazer versos, de viver sempre abraçados
Naquela base do só vou se você for
Mas, de repente, fomos ficando cada dia mais sozinhos
Embora juntos cada qual tem seu caminho
E já não temos nem vontade de brigar
Tenho pensado, e Deus permita que eu esteja errada
Mas eu estou, eu estou desconfiada
Que o nosso caso está na hora de acabar.
Fim de Caso é um clássico do nosso cancioneiro e já foi gravado infinitas vezes, as gravações mais intensas são as da própria Dolores, a de Nana Caymmi ( que fez um disco tributo para a artista) e de Maysa; a mais sublime está na voz de Gal Costa.
O desespero saudoso de Duran pode ser percebido em Por Causa de Você, outro clássico:
Ah, você está vendo só
Do jeito que eu fiquei
E que tudo ficou
Uma tristeza tão grande
Nas coisas mais simples
Que você tocou
A nossa casa querida
Já estava acostumada
Guardando você
As flores na janela
Sorriam, cantavam
Por causa de você
Olhe meu bem nunca mais
Nos deixe por favor
Somos a vida e o sonho
Nós somos o amor
Entre meu bem por favor
Não deixe o mundo mau levá-lo outra vez
Me abrace simplesmente
Não fale, não lembre
Não chore meu bem
(Tom e Dolores)

Agora, para conhecer poeticamente as asperezas e as inspirações que a solidão traz: Noite de Paz, na voz de Nana, é claro, para nos destruir com as imagens da saudade noturna, a letra:

Dá-me, Senhor
Uma noite sem pensar
Dá-me Senhor
Uma noite bem comum
Uma só noite em que eu possa descansar
Sem esperança e sem sonho nenhum
Por uma só noite assim posso trocar
O que eu tiver de mais puro e mais sincero
Uma só noite de paz pra não lembrar
Que eu não devia esperar e ainda espero.
Ainda é janeiro em Salvador, estas coisas não chegam bem com muito sol; mas Dolores é eterna para quem ama ouvindo o melhor da Música Popular Brasileira e sente que o sentido da espera acabou, mas levou consigo nossas noites em paz e com sono. Ave Dolores Duran!

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