terça-feira, 8 de julho de 2008

Intérprete do afro-Brasil



Em finais de 2007, no Centro de Estudos Afro-Orientais (Ceao-Ufba), foi lançado o livro Vivaldo da Costa Lima – Intérprete do Afro-Brasil, organizado pelos antropólogos e professores Cláudio Pereira e Jeferson Bacelar, editado e distribuído pela Edufba, com a proposta de fazer uma justa homenagem a um dos intelectuais das ciências sociais que melhor contribuíram para a sistematização, registro e preservação da memória religiosa e cultural dos povos negros na Bahia, e, por conseguinte, em todo Brasil: o antropólogo Vivaldo da Costa Lima.

Formado em odontologia, o professor Vivaldo enveredou desde cedo para os caminhos da antropologia, sendo um dos pioneiros do Ceao a viajar para a África buscando ressonâncias, entre os povos iorubanos e ewefon , em partes da atual Nigéria e do antigo Daomé, de práticas religiosas do candomblé, estudadas por ele nos principais terreiros que compõem a tradição do modelo jeje-nagô em nossa terra, a matriz Casa Branca, o Gantois e o Axé Opô Afonjá.

Iniciado como ogã, consagrado ao orixá Ogum pela saudosa Mãe Senhora de Oxum Miwá, do Afonjá, o ilustre professor foi um exímio continuador dos estudos inaugurados por Nina Rodrigues e também elaborados por nomes comoManoel Quirino, Arthur Ramos, Edison Carneiro, Ruth Landes, Roger Bastide, Pierre Verger, fazendo do resultado de suas pesquisas, dialógicas com grandes teóricos da antropologia ocidental, de acurada observação participante de marcante rigor metodológico, uma das mais representativas obras etnológicas sobre o universo do candomblé: A Família de Santo, lançada pela primeira vez em meados dos anos 70.

Pode-se dizer que, com a verve de seus estudos, e com o requinte de sua escrita bem-feita e comunicativa, o Prof. Vivaldo marcou a etnologia brasileira, colocando-se como um dos nomes mais expressivos da nossa antropologia no século XX, sem dever nada a nenhum outro estudioso de prestígio nesta área. Estruturador teórico da idéia de família-de-santo nos terreiros, ele talvez seja o nosso maior especialista em antropologia do alimento, hoje aos 82 anos, continua a ser buscado para “ensinar” aos seus pares acadêmicos e aos civis, quando o assunto é religiões afro-brasileiras e alimentação do ponto de vista antropológico.

O livro organizado por Pereira e Bacelar é uma reunião de artigos que singram temáticas socioantropológicas, trazendo nomes de grandes professores nacionais, como Maria Rosário G. da Carvalho, Júlio Braga, Yeda Pessoa de Castro, Armindo Bião e até do francês Michel Maffesoli, entre outros.

O artigo do Prof. Jeferson Bacelar, intitulado Pedagogia do viver, que abre a coletânea, é ilustrativo ao revelar a importância de Vivaldo na seara dos estudos sociais no Brasil e reforça a idéia de que esse dentista de formação, exímio antropólogo, foi (e é) para a etnologia brasileira um verdadeiro arquiteto, que, como artista, realizou obras imperecíveis para a memória das religiões erguidas pelos negros em nosso País.

(Publicado no Opinião do A Tarde em 21/05/2008) .

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